Maria Clara Lucchetti Bingemer
O ano vai acabando com tristezas e alegrias. Partiu a fantástica
escritora e acadêmica Nélida Piñon. Além de mulher de letras inspirada e
fecunda, foi a primeira a presidir a Academia Brasileira de Letras e até hoje
mantinha intensa atividade no mundo da cultura brasileira e também
ibérica. A conexão entre sua Espanha Natal e o Brasil era um ponto
constante e importante de sua agenda.
Além disso, Nélida constituía uma quase unanimidade. Jamais encontrei
alguém que não a admirasse e estimasse. Doce, próxima, alegre, presença
agradabilíssima e enriquecedora em qualquer ambiente, tinha uma incontável
legião de amigos e admiradores. Partiu inesperadamente, em Lisboa, onde
se encontrava. E deixa um vazio grande em termos humanos e
literários.
Fica conosco o legado de sua alegria e esperança. Nélida já havia tido um
encontro próximo com a morte há alguns anos. Felizmente o diagnóstico que
lhe foi dado não se concretizou e pudemos contar com ela novamente entre nós por
mais tempo. Desde aí, segundo seu próprio testemunho, passou a ver a vida
de outra maneira e por outro ângulo. E isso a fez ainda mais profunda e
adorável.
Mas esse fim de ano também celebra chegadas. Uma delas aconteceu
ontem. A tão esperada Copa do Mundo voltou para as mãos da América Latina
após vinte anos. A orquestra do time albiceleste foi dirigida com
genialidade pelo maestro Leonel Messi, que também traz consigo a marca da
unanimidade. Não há quem não admire seu talento, sua força em
campo. Sobretudo admirável é sua capacidade de unir o time e fazê-lo
trabalhar como realmente uma equipe.
Messi não faz questão de “assinar” seus gols. Com tranquilidade e alegria
leva a bola aos pés dos companheiros para que eles finalizem a jogada.
Consola um, anima outro, insiste no esforço. Traz em si, além do talento
do jogador e da disciplina do atleta, a marca do verdadeiro líder. A
equipe por ele capitaneada teve um belo desempenho e mereceu a taça que levantou
após longo jejum. Parabéns, Argentina!
Tomara que a chegada dessa vitória
entre tantas derrotas do país da albiceleste, assim como de todo o continente,
nos deixe algumas lições. A primeira seria o desprendimento que exige
trabalhar em equipe. Não importa quem marca o gol, importa que o gol seja
marcado ainda que não por mim e a equipe triunfe. Importa a união que faz
realmente a força, como diz o ditado popular. A combalida e fragmentada
Argentina, dividida em polarizações várias, com a inflação pelas alturas, que
luta por maior justiça e paz, hoje canta feliz com a vitória da sua
seleção. Que a beleza desse triunfo possa se refletir na sociedade do
país vizinho.
Quanto a nós, vizinhos mais ao norte,
temos também lições a levar para casa após esta Copa do Qatar. Esqueçamos
por um momento a tradicional rivalidade em campo entre os dois países.
Após a sofrida derrota nas quartas de final, o Brasil poderia aprender bastante
com a seleção do país ao sul. Espera-se para o futuro uma seleção mais focada
em disciplina e desempenho, sem tanta frivolidade. Queremos atletas e não
celebridades. Não se pretende aqui generalizar injustamente, apenas
apontar algo que apareceu desta vez e que seria bom que mudasse para o futuro
próximo.
O mesmo acontece em nível do
país. Neste momento de transição de governos, onde as disputas por cargos
se veem ferozes e devoradoras. A impressão é de que o que menos importa é o bem
do país e a integração de forças para conseguir reconstruí-lo. Interesses
individuais e partidários se atravessam no caminho daquilo que poderia ser uma
bela e rica reconstrução nacional. Não importa quem faz que gol.
Importa que o placar seja cheio de gols diversos e convergentes para um futuro
promissor.
A grande chegada deste período
ocorrerá, porém, daqui a alguns dias. Temos vivido sua espera, sua
preparação, e sobretudo seu ardente desejo. Vamos celebrar o Natal que
nos diz que quando nem nós acreditamos mais em nós mesmos, Deus continua
apostando nessa humanidade torta, mas ao mesmo tempo tão bela que somos e que
sai constantemente de Suas mãos.
O Menino vai chegar. Belo .
Como diz João Cabral de Melo Neto: “...tão belo como um sim/numa sala
negativa.../... Belo como a última onda que o fim do mar sempre adia/ é
tão belo como as ondas em sua adição infinita./ Ou como o caderno novo/ quando
a gente o principia./...E belo porque o novo/ todo o velho contagia...Belo
porque corrompe/com sangue novo a anemia./...Infecciona a miséria/com vida nova
e sadia.”
Maria Clara Bingemer, é professora do Departamento de Teologia da
PUC-Rio e autora
de “Santidade:chamado à humanidade” (Editora Paulinas), entre outros livros.
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Maria Helena
Guimarães Pereira
MHP Agente Literária - Assessoria
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