Por Marcelo Barros
Estamos na semana de
eleições presidenciais, eleições para o Congresso e também para o governo dos
Estados e assembleias estaduais. Não são poucos os candidatos que recorrem a
Igrejas para se elegerem e há grupos que pensam que cristão deve votar em
cristão. Conforme o evangelho e a ética da fé, não deve ser esse o pensamento.
Como diz Jesus no evangelho: “Não é quem diz Senhor, Senhor, que entra no reino
dos céus, mas quem faz a vontade do Pai” (Mt 7, 21).
O critério para eleger
alguém não pode ser se a pessoa é de tal Igreja ou religião e sim se, de fato, se
propõe a servir às boas causas de todo o povo. Como vivemos em um país desigual
e dividido, é importante que escolhamos pessoas que ajudem a tornar o Brasil
mais justo, menos desigual e as classes empobrecidas possam ter sua cidadania
reconhecida.
As eleições nada têm a ver
com Igrejas, mas têm sim a ver com Espiritualidade. Não se pode dividir a vida
em material e espiritual, nem reduzir a fé a algo íntimo e apenas religioso. Se a Política e a Espiritualidade não se
encontrarem, a Política vira politicagem e a espiritualidade se torna somente
devoção privada e intimista. Temos de redescobrir e valorizar a dimensão
política da espiritualidade, assim como redescobrir a base espiritual da
Política. A nossa busca espiritual do Amor Divino tem de se manifestar no modo como
exercemos nosso compromisso de cidadãos e cidadãs de uma pátria e de uma
cidade.
Não é verdade que a Política
é assunto que não se discute. Menos ainda é justo afirmar que nenhum político
presta. É ingenuidade dizer: “Não gosto de Política”. Todos nós fazemos
política quando convivemos em sociedade e exercemos alguma função social. De
fato, muitos entram na Política profissional para se beneficiarem
individualmente. Esses servem a interesses seus ou do grupo que os pagam e não
às causas do povo. No entanto, existe, sim, uma minoria que pede os nossos
votos para representar o povo e garantir o direito de todos.
No próximo dia 14, o papa Francisco
vai canonizar Monsenhor Oscar Romero, arcebispo de El Salvador. Assim, o papa
reconhece publicamente que Romero deu a vida para defender os pobres e lutou
até o fim pelo que ele chamava de “dignidade da Política”, como serviço ao bem
comum.
No Brasil, essas eleições
estão muito polarizadas. Para votar com coerência espiritual, é preciso ser
dócil ao Espírito de Deus em nós e não seguir critérios de interesse pessoal,
de família ou votar apenas por relação de amizade. O nosso voto pode ajudar a
construir uma sociedade mais justa. No entanto, ao contrário, pode também perpetuar
os velhos vícios do sistema vigente. Não estamos em uma sociedade ideal e todos
os partidos têm falhas. No entanto, é importante discernir entre as diversas
escolhas possíveis, a escolha que nos parece ser a mais justa e adequada para o
bem comum e as causas dos mais pobres. Quem tem fé em Deus ou simplesmente na
Vida não deveria dar o seu voto a quem prega discriminações sociais, faz diferenças
de direitos entre homens e mulheres e revela claramente intolerância contra
minorias sexuais.
Os
Evangelhos contam que, ao entrar em Jerusalém, Jesus foi ao templo e ali, com
um chicote em punho, expulsou os cambistas e vendedores de animais para os
sacrifícios. Esse gesto anunciava que, a partir de Jesus, a nossa relação com
Deus não precisa de templos nem de sacrifícios. No entanto, essa cena de Jesus
expulsando do templo os comerciantes pode também servir como símbolo para a Política.
A atividade política deve ser vista como novo templo divino, como espaço
formador da dignidade coletiva de um povo. Por isso, é preciso sempre de novo expulsar
dela os vendedores que a diminuem e a envergonham. Hoje, o chicote com o qual
podem ser expulsos da política os que a reduzem a um negócio de interesse e
mercado só pode ser o voto consciente e ético de cada cidadão/ã. O evangelho diz que devemos julgar as pessoas
e partidos conforme a prática e pelos seus resultados. “Pelos frutos bons,
vocês podem discernir que a árvore é boa, assim como pelos maus frutos, verão
que uma árvore é má. Pelos frutos, vocês podem discernir se a árvore é boa ou
má” (Mt 7, 18).
MARCELO BARROS é monge beneditino e
escritor. Tem 44 livros publicados, dos quais “O Espírito vem pelas
Águas", Ed. Rede da Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
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