Por Frei
Betto
A Bahia, e
todo o Brasil, recepcionam a primeira santa genuinamente brasileira, Santa
Dulce dos Pobres, como a qualificou o papa Francisco.
Elevar aos
altares uma mulher que dedicou a sua vida aos excluídos é ligar o alarme à
consciência de uma sociedade acomodada que, infelizmente, aprendeu a viver com
a desigualdade social como se fosse natural. Herança de 350 anos de
escravatura, a mais longa das três Américas.
Em 2018, o
rendimento da fatia mais rica da população subiu 8,4%, enquanto os mais pobres
sofreram uma redução de 3,2%. Brasileiros que estão no 1% mais
rico ganharam 33,8 vezes mais que o total dos 50% mais pobres, segundo
dados divulgados pelo IBGE na última quarta-feira (16/10).
Ora, ninguém
escolhe ser pobre. Todo pobre foi levado, involuntariamente, à privação de
acesso à vida digna. E este direito é central na mensagem de Jesus, que afirmou
“vim para que todos tenham vida e vida em abundância” (João 10,10).
Por isso, ele
curou doentes, repartiu pães e peixes, denunciou opressores (Mateus 23) e
adotou como símbolo de sua missão o mais elementar e universal alimento humano:
o pão, a ponto de proclamar “eu sou o pão da vida”. Ou seja, aquele que veio
quebrar as barreiras que instalam a desigualdade e promovem a exclusão.
Irmã Dulce é a
santa de todos, porém realçada como aquela que merece veneração e devoção
universal por dedicar a sua vida para que outros tivessem vida.
Ela é exemplo
de como devemos imprimir às nossas existências um sentido solidário. E,
sobretudo, atacar as causas da pobreza.
Em futuro
próximo, se Deus quiser, teremos outro santo nordestino, Dom Helder Camara, que a ditadura militar chamava de
“bispo vermelho “. Quando perguntado, em suas viagens ao exterior, o motivo de
tal epíteto, ele respondia: “Quando falo dos pobres, todos me chamam de
cristão. Quando denuncio as causas da pobreza, me chamam de comunista”.
Frei Betto é escritor, autor de “Minha avó e seus
mistérios” (Rocco), entre outros livros.
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