
No
Brasil, apesar da Constituição Brasileira defender a liberdade de culto para
todas as tradições religiosas, ainda existem programas de rádio e televisão nos
quais se pregam a intolerância e se combatem algumas tradições religiosas, como
por exemplo, as de matriz afrodescendente. Assim, em janeiro do ano de
2000, no Rio de Janeiro, Mãe Gilda, Yalorixá do Candomblé, viu duas vezes o seu
templo ser invadido por pessoas de uma Igreja neopentecostal que entraram no
templo e destruíram os assentamentos dos Orixás. E no dia 21 de janeiro, Mãe
Gilda viu estampada em um jornal uma foto sua com a legenda:
“Macumbeiros ameaçam a vida e o bolso dos clientes”. Ao ver aquilo, aquela
senhora idosa teve um infarto e faleceu. Para que não se repitam mais fatos
como esse, em 2007, o presidente Lula assinou uma portaria através da qual,
cada ano, 21 de janeiro é considerado o “Dia Nacional contra a Intolerância
Religiosa”.
Para
acabar com a intolerância cultural e religiosa, não basta uma lei ou decreto. É
preciso transformar interiormente o processo da fé. Muitas confissões
religiosas ainda confundem a verdade com uma forma cultural de expressar a
verdade. Por isso absolutizam dogmas e tendem a se fechar em um autoritarismo
fundamentalista. Daí, facilmente, se justificam conflitos e até guerras em nome
de Deus. Em 1965, em um dos seus mais belos documentos, (a declaração Nostra
Aetate), o Concílio Vaticano II proclamava o valor das outras religiões e
incentivava os católicos do mundo inteiro ao respeito ao diferente e ao
diálogo. Também, em 1961, o Conselho Mundial de Igrejas, que reúne mais de 340
Igrejas evangélicas e ortodoxas, pediu às Igrejas cristãs uma atitude de
respeito e diálogo com todas as culturas e colaboração com outras tradições
religiosas.
Atualmente,
no mundo, a diversidade cultural e religiosa é, não somente um fato que,
queiramos ou não, se impõe à humanidade. Devemos reconhecê-la como graça divina
e bênção para as tradições religiosas. Assim, elas podem se complementar e se
enriquecer mutuamente. Nenhuma tem o monopólio da verdade. Todas estão em
caminho, como peregrinas da verdade que a maioria das tradições chama de Deus.
Com nenhuma religião, Deus assinou contrato de exclusividade. E ao contrário,
nas diversas tradições, de um modo ou de outro, revelou que se deixa encontrar
no diálogo e na abertura ao diferente.
Para
que este diálogo seja verdadeiro e profundo, cada grupo religioso tem de
reconhecer o que Deus nos revela, não somente a partir da sua própria tradição,
mas do caminho religioso do outro. Não para que o cristão se torne budista ou o
budista se torne cristão, mas para que cada um, em sua tradição, seja
enriquecido espiritualmente com a iluminação que o outro recebe.
Para
esta abertura pluralista e para o diálogo daí decorrente vale o que, no século
IV, dizia Santo Agostinho: “Apontem-me alguém que ame e ele sente o que estou
dizendo. Dêem-me alguém que deseje, que caminhe neste deserto, alguém que tenha
sede e suspira pela fonte da vida. Mostre-me esta pessoa e ela saberá o que
quero dizer” [1].
[1] - AGOSTINHO, Tratado sobre o Evangelho de João 26, 4. Cit. por Connaissance des Pères de
l’Église32- dez. 1988, capa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário