Por Marcelo Barros
Como ocorre a
cada ano, na 4a feira passada, 05 de junho, a ONU celebrou o Dia
mundial do Ambiente. Organismos internacionais, responsáveis pelo cuidado com o
planeta e o ar que respiramos, repetiram declarações pouco otimistas sobre a
realidade. Nem precisamos mais ler documentos para saber que a situação da
Terra devastada, das águas contaminadas, do ar poluído e do aquecimento global
tem crescido sempre mais. Não é segredo para ninguém que, nos Estados Unidos, o
presidente considera tudo isso bobagem e retirou o país de todas as convenções
sobre o clima. No Brasil, o atual governante, discípulo e fiel seguidor de
Trump, nos poucos meses em que está no poder, já liberou 170 novos tipos diferentes
de agrotóxicos para envenenar nossos campos. Por serem perigosos à vida humana,
vários desses produtos estão proibidos em países nos quais os cidadãos ainda
têm algum controle sobre as políticas públicas. No Brasil e em países vizinhos,
não há mais nenhum rio ou lagoa que não apresentem índices preocupantes de
contaminação por resíduos químicos. Além disso, as empresas mineradoras que
dominam regiões inteiras do país revelam total despreocupação com a segurança
da população. A imprensa fala de represas da Vale do Rio Doce em Minas Gerais
que apresentam risco de rompimento. No entanto, existem várias na mesma
situação na região amazônica, assim como em países vizinhos.
Cada vez mais
cresce o número de cientistas que afirmam: o planeta Terra chegou ao seu limite.
O estilo de crescimento econômico dominante na maior parte do mundo destrói as
florestas para aumentar o agronegócio e o lucro dos mais ricos. Polui os rios e
acaba com a vida que ainda existe nas águas. Torna o ar atmosférico
irrespirável e cria doenças respiratórias e alérgicas antes inexistentes. A
essa crise ambiental, se soma o desequilíbrio social. Nos últimos dez anos, a
riqueza se concentrou nas mãos de cada vez menos pessoas. E 5% da humanidade
tem uma renda econômica superior a mais de cem países do mundo.
A
responsabilidade maior pela crise ecológica
e civilizatória cabe aos mais ricos. Eles são os que mais poluem e
destroem a natureza. No entanto, na hora de pagar a conta e sofrer as
consequências dessa atitude irresponsável e criminosa, somos todos nós, seres humanos que sofremos. Quem mais padece
com as inundações cada vez mais frequentes e as secas sempre mais prolongadas
são sempre as populações mais empobrecidas.
Apesar de toda essa realidade tão grave, a mãe Terra e a
natureza resistem. Desde finais de março, o sertão nordestino recebe chuvas.
Hoje, rios represados para projetos capitalistas perderam o seu rumo natural. Não
se pode mais cantar como Luiz Gonzaga na volta da Asa Branca: “Rios correndo, as cachoeira tão
zoando, terra moiada, mato verde, que riqueza. E a asa branca, tarde canta, que
beleza...”. Seja como for, a vida é subversiva e
transgride os projetos da morte, impostos pelo poder econômico que domina o
mundo. Esse milagre da subversão da Vida deve nos alegrar e nos encher de
esperança. No entanto, ele não será por muito tempo, se nós não colaborarmos. É
urgente que a humanidade opte pela Vida e, no lugar de algoz, se torne aliada
da Terra, das águas e da natureza. Graças
a Deus, em todo o mundo já existe uma verdadeira rede de organizações sociais e
de iniciativas que propõem esse novo caminho para a humanidade.
As comunidades
de várias tradições espirituais acreditam: a natureza é dom divino. Revela a
presença do Espírito de Amor no universo. A Terra, as águas e todo o universo
têm uma sacralidade que merece ser
respeitada e cuidada. A terra não é apenas propriedade a ser vendida e
comprada. As plantas e animais não valem apenas pelo preço que lhe dão. Não
podem ser vistos apenas por quantos quilos têm. Embora seja legítimo que na
seleção natural e na reciclagem do tempo, uns seres alimentem os outros, nós, humanos, formamos com todos os seres
vivos uma Comunidade de Vida. E recebemos do Espírito do Amor que fecunda o
universo a tarefa de zelar por todos com carinho e cuidado.
O remédio
para a crise ecológica é resgatar o coração e incorporar a sensibilidade
afetiva e amorosa à racionalidade com a
qual tomamos nossas decisões e planejamos o futuro. Sem essa sensibilidade, a
tecnociência continuará sendo utilitarista, fria e funcionalista.
Em qualquer
religião que seja, Espiritualidade é o caminho no qual nossa atividade e
comportamento encontram sua centralidade no cuidado com a Vida. Trilhamos esse
caminho de amor porque o vivemos na intimidade do Espírito que se revela como
amor e se encontra conosco nesse percurso. Nesse domingo, os cristãos do
Oriente e do Ocidente celebraram a festa de Pentecostes. Desde antigamente, a
liturgia latina começa com um verso adaptado do livro da Sabedoria: “O Espírito de Deus enche todo o universo.
Abraça toda a criatura e contém em si todo o saber, aleluia” (Sb 1, 7).
MARCELO BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 44 livros publicados, dos quais “O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede da Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
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