Marcelo Barros
Nestes dias, por todo o
mundo, as pessoas dizem umas às outras os votos de feliz ano novo. Há quem
acredite que, pelo fato de se falar, o desejo se torna realidade, quase de modo
automático. Outros pensam que o próprio desenrolar do tempo faz as coisas
ficarem melhores.
Alguns povos
tradicionais ainda guardam costumes como, na noite do ano novo, queimar toda a
roupa usada e iniciar esse tempo com vestimentas brancas ou novas, símbolo de
renovação da vida. Na madrugada do primeiro dia do ano, fieis dos cultos afrodescendentes
vão às praias e rios com flores e oferendas aos espíritos do céu e da terra. Em
nome de todos os seres humanos, cantam sua disposição de amor e comunhão
universal.
As perspectivas de 2023
para o mundo não parecem otimistas. A ambição das grandes potências, o
interesse das industrias armamentistas e os projetos imperialistas dos Estados
Unidos e da Rússia mantêm a guerra na Ucrânia e garantem outras guerras pelo
mundo. A ONU ainda tenta salvar a ecologia a partir de projetos capitalistas
como entregar a defesa da natureza a grandes empresas. A água continua sendo
tratada como mercadoria a ser privatizada. Mesmo sabendo que as pandemias
ameaçam toda a humanidade e ninguém se salva sozinho, a Organização Mundial da
Saúde ainda se omite em relação à campanha mundial para que todas as vacinas
contra vírus sejam gratuitas e para todos e todas.
Na América Latina, o
sonho de uma pátria grande solidária exige mais esforços. A guerra dos meios de
comunicação contra qualquer transformação do mundo a favor dos empobrecidos
continua implacável.
No Brasil, o ano novo
foi marcado pela imagem da posse de um novo governo. Na cerimônia, ficou
marcada para a história a imagem de um velho índio, a criança negra, a catadora
de material reciclável e mais outras pessoas, representativas da população mais
empobrecida ao subir a rampa do palácio do Planalto com o presidente Lula. Tomara
que este gesto tão forte de simbolismo não se dilua na cultura vigente que
ainda mantém uma separação gritante entre governo e sociedade civil. No dia da
posse, o ritual prevê o encontro do Presidente eleito com o Congresso e os
poderes constituídos, mas o povo é mantido do lado de lá da cerca armada depois
do lençol de água que separa o palácio da população. Parece que ao povo compete
apenas acenar e aplaudir.
Para que, no Brasil e no
mundo, este ano novo se torne realmente um tempo novo, será necessário firmar
as bases de uma sociedade civil organizada a partir da inclusão social e de uma
educação para a Paz, a não-violência e o diálogo. Sem dúvida, as religiões que,
durante séculos, conviveram com as desigualdades e as injustiças sociais e
muitas vezes as legitimaram, têm agora a função de desenvolver uma
espiritualidade libertadora que testemunhe Deus como Amor e não como poder opressor.
No Fórum Social, ocorrido em Túnis,
na África, em 2015, havia um grande folder no qual estava escrito: "A humanidade precisa de uma verdadeira
revolução. Só a nossa ousadia pode torná-la possível". Essa ousadia
comunitária parte da convicção de que o amanhã pode ser diferente. Para os
cristãos, nos alegra mais ainda a fé de que, nesse caminho, estamos sempre
acompanhado por Jesus ressuscitado que disse a seus discípulos/as: "Eu estarei com vocês todos os dias, até que
esse tempo se complete" (Mt 28, 20).
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