Frei Betto
A classe média é a salsicha do sanduíche da desigualdade social. Ela sobe uma
rampa ensaboada: quanto mais se esforça para atingir o topo, mais escorrega
para baixo. Trata-se de uma classe híbrida, com variados perfis. Há quem já
tenha nascido na classe média, filho de profissionais liberais. Há os que
vieram da classe assalariada ou da zona rural e ascenderam socialmente graças à
escolaridade que seus pais não tiveram. Há ainda quem se refira nostalgicamente
à fazenda ou à casa espaçosa dos avós, gente outrora abastada, cujos netos
agora moram em apartamentos e ganham menos do que gostariam.
A classe média ascendente é mais conservadora. Sonha atingir o cume da pirâmide
social. Regozija-se por haver trocado a carteira de trabalho assinada pelo
negócio próprio e a periferia sem saneamento pela rua asfaltada.
Para esse setor da classe média, a solução para a criminalidade se resume em
mais polícias e mais cadeias. Não duvida de que o noticiário da TV fala sempre
a verdade. E se sente confortável por possuir carro, celular e computador,
ainda que more de aluguel e viva endividado.
A classe média descendente é filha ou neta de uma estirpe que, no passado, teve
baixelas de prata, taças de cristal e empregadas dia e noite. É sofrido para
quem já foi rei perder a majestade. Por ter meia dúzia de amigos ricos e boa
escolaridade, esse setor vive a ilusão de estar muito próximo de ser aceito no
seleto clube da elite, embora tenha consciência de que lhe falta o essencial –
capital.
Já a classe média média oscila entre o conservadorismo e o progressismo. Os
avós são conservadores, cultivam o “American way of life”, enquanto os netos
exibem camisetas com a estampa de Che Guevara e votam em candidatos de
esquerda.
Entre todos os segmentos da classe média há algo em comum: ai dos filhos jovens
se os pais não os socorressem com periódicas ajudas financeiras! Se os avós
tiveram empregos bem remunerados, e os filhos alcançaram a época em que
ainda era viável fazer poupança, agora os netos estão longe de poder alçar voo
próprio. São dependentes familiares. Se não estão desempregados, ganham muito
menos do que a geração anterior ao desempenhar as mesmas funções. E sabem que o
futuro não é nada alentador...
Não é mesmo. O avanço tecnocientífico engole, cada vez mais, os postos de
trabalho. A maioria dos candidatos a um deles não preenche os requisitos
mínimos: não é capaz de redigir uma carta, não tem leitura, não domina um
idioma estrangeiro, tem baixo nível de cultura geral.
Qual o futuro dessa nova geração? No atual modelo de sociedade consumista,
nenhum, exceto para um em cada mil. O sistema vigente é intrinsecamente
seletivo e excludente.
A saída seria um modelo pós-capitalista baseado na redução da desigualdade
social e na preservação do meio ambiente, ancorado na sustentabilidade, como
propõem Thomas Piketty (“O capitalismo no século XXI”), e Glen Weyl e Eric
Posner (“Desenraizando o capitalismo e a democracia para uma sociedade justa”).
Ou uma sociedade socialista capaz de compatibilizar liberdade individual e
justiça social, propriedade estatal e capital privado.
Enquanto não se alcança o ideal, a única solução em curto prazo são políticas
sociais centradas na seguridade e na inclusão, e o Estado como indutor do
desenvolvimento que prioriza o trabalho, não o capital.
Frei Betto é escritor, autor
de “Reinventar a vida” (Vozes), entre outros livros.
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