Por
Marcelo Barros
Na sociedade civil, essa semana é marcada pela
comemoração do dia internacional da mulher (08 de março). Essa data recorda que
em Nova York, ainda no século XIX, (1857), um grupo de mulheres foi assassinado
por reivindicar melhores condições salariais e o direito ao voto. Depois de mais
de 150 anos, em quase todo o mundo, a igualdade legal entre homem e mulher e os
direitos civis das mulheres estão garantidos. No entanto, ainda há muito
caminho a percorrer para vencer discriminações e violências. Em todas as
cidades brasileiras, se registram diariamente cenas de desrespeito, maus tratos
e até assassinatos, isso é, feminicídios, nos quais a vítima é mulher e a
violência é sofrida pelo fato de ser mulher.
Atualmente, se espalham pelos ambientes
sociais e das Igrejas boatos sobre o que chamam de “ideologia de gênero”. Em nome dessa ficção, inventada para impedir
o aprofundamento do problema real, as pessoas e mesmo alguns grupos cristãos
tomam posição pelo atraso e pela injustiça social e humana. O que existe e é
urgente é a necessidade de uma justa relação de gêneros. Para isso, se deve compreender
a distinção entre sexo e gênero. Podemos afirmar que sexo é o que nos diferencia em termos anatômicos e fisiológicos. Gênero é categoria social. É aquilo que
diferencia socialmente as pessoas. Os papéis sociais e funções atribuídas a
homens e mulheres variam de acordo com cada época e cultura. Identidade de
gênero é a maneira como alguém se identifica na sociedade. Nem sempre a
identidade de gênero corresponde ao sexo fisiológico ou de nascimento. Alguém
pode nascer com os órgãos sexuais masculinos e se identificar socialmente com o
gênero feminino e vice-versa. Essa pessoa tem sexo de homem, mas pertence ao
gênero feminino. É transexual. Há pessoas que nascem com sinais dos dois sexos.
É fundamental que ninguém seja discriminado ou perseguido por causa disso. A
humanidade nunca construirá sua felicidade se não respeita o direito à
diversidade de gêneros e a igual dignidade de todas as pessoas, sejam de que
gênero forem e seja qual for sua orientação sexual. Esse direito à diversidade
e respeito à igualdade entre os gêneros é
causa comum a mulheres e homens. Somente assim, todos os seres humanos, de
ambos os sexos, se libertarão de suas armaduras de medo e se tornarão cúmplices
na busca de uma felicidade compartilhada, sem algozes, nem vitimas. Essa
relação de parceria entre homens e mulheres, na diversidade de orientações
sexuais e na defesa das minorias ainda discriminadas é objeto de conquista
cotidiana e permanente.
Nos ambientes cristãos, o dia internacional
da mulher (08 de março) ocorre em plena celebração da Quaresma, tempo de
revisão de vida, renovação interior e de mentalidades. Isso é muito oportuno
porque as Igrejas cristãs e outras religiões têm uma dívida histórica e moral
com a causa da igualdade social e das relações de gênero.
Em nome de Deus, em toda a história e até
nossos dias, a maioria das Igrejas e religiões têm sido cúmplices do
patriarcalismo e do moralismo vigente. Usam o nome divino para legitimar
preconceitos sociais e injustos. Ao contrário, quem se deixa guiar pelo
Espírito, qualquer que seja a sua tradição religiosa, sabe que a desigualdade
ou discriminação, seja de gênero, racial ou social são anti-espirituais. Mesmo no
clamor calado da mulher oprimida e das minorias sexuais discriminadas em seus
direitos à diversidade, quem é atento à voz do Espírito escuta o próprio grito
do Cristo na cruz e o gemido de Deus solidário com quem sofre.
Nesta semana em que o mundo inteiro será mais
sensibilizado para a causa da igualdade de gêneros e da justa promoção da
mulher, recordemos o que afirmou sua santidade, o Dalai Lama: “Todos nós temos de desenvolver a capacidade
de empatia recíproca que, interiormente, cada pessoa possui. É a incapacidade
de suportar o sofrimento da outra pessoa. Só a solidariedade compassiva salvará
o mundo”.
MARCELO BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 44 livros
publicados, dos quais “O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede da
Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
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