Por
Maria Clara Bingemer
"Sínodo" é uma
palavra antiga muito reverenciada pela Tradição da Igreja, cujo significado
está associado ao conteúdo mais profundo da Revelação. Palavra grega, é
composta pela preposição (syn – com, em conjunto) e pelo substantivo (odos –
caminho). Indica, pois, o caminho tomado pelos membros do Povo de Deus no
seguimento de Jesus. Refere-se diretamente ao Senhor Jesus, que se apresenta
como "o caminho, a verdade e a vida”, e o fato de que os cristãos, seus
seguidores, eram originalmente chamados "os discípulos" do Caminho ”.
Aplica-se, portanto, aos
cristãos, discípulos de Jesus convocados em assembleia e, às vezes, aparece nos
textos como sinônimo da própria comunidade eclesial. Como esta é concebida como
Povo de Deus a caminho, a sinodalidade não é algo pontual e acessório na
Igreja, mas sim seu estado permanente. A Igreja quer ser sinodal, estar sempre
em caminho unida no seguimento de Jesus Cristo. O papa Francisco tem
valorizado muito esta nota e este modo de a Igreja ser. E nesse espírito
convocou o Sínodo da Amazônia, acontecido há pouco em Roma.
O documento final dá
conta da motivação que levou a convocar o Sínodo e o fruto daqueles dias de
caminho. Na origem está a situação de destruição que afeta a Amazônia e
com ela toda a terra e a humanidade. Se continuar o processo agora
vigente, o resultado pode ser a destruição do território amazônico e de seus
habitantes, sendo os mais afetados os povos indígenas. E isso impactará em todo
o planeta, já que a desaparição do bioma amazônico será catastrófica.
A nota característica do
Sínodo foi o desejo e a demanda de integração da voz da Amazônia com a voz e o
sentir dos bispos participantes, pastores da Igreja. Foi, no dizer da
assembleia reunida sinodalmente, uma nova experiência de escuta para discernir
os novos caminhos pelos quais o Espírito deseja conduzir a Igreja. Assim,
o Sínodo, mais que um evento eclesial, foi um compromisso de abraçar, assumir e
praticar o novo paradigma da ecologia integral, o cuidado da “casa comum” e a
defesa da Amazônia.
Vimos todos nas mídias
mais variadas a presença dos povos originários dentro do Vaticano. Seus
símbolos povoaram nosso raio visual com cocares, que inclusive foram usados
pelo próprio Papa e por bispos presentes. Tudo isso é a valorização das culturas
autóctones indígenas, algo sem precedentes. O documento final
declara ser indispensável uma conversão ecológica para uma vida sóbria.
Isso implicará mudanças de mentalidade, estilo de vida, modos de produção e
práticas relativas ao uso e distribuição dos bens.
O documento diz ainda que
a Igreja é chamada a assumir seu papel profético de denunciar a violação dos
direitos humanos das comunidades indígenas e a destruição do território
amazônico. Para isso, deve ser uma igreja pobre, inculturada e samaritana.
Pronta para a solidariedade e a partilha com os povos que habitam a Amazônia e
dela vivem, e pedem ao mundo atenção e participação ativa na luta por sua
sobrevivência.
Durante a celebração do
Sínodo um grupo de bispos renovou o Pacto das Catacumbas. Mais de 40
participantes, sob a liderança do cardeal Cláudio Hummes, relator do Sínodo,
assumiu o compromisso de defesa dos pobres, dos territórios e da conservação
socioambiental da Amazônia. O texto do pacto – que recebeu o nome de Pacto das Catacumbas
pela Casa Comum – se apoia na Encíclica Laudato Si do Papa Francisco.
Algumas questões
importantes quanto à organização da Igreja também foram debatidas, tais como a
ordenação de homens casados e a criação de um diaconato feminino para atender a
região amazônica, onde o clero é muito escasso e demanda ministros
afinados com a cultura local. Estes pontos, assim como todos os outros, devem
ser cuidadosamente examinados pelo papa, que então entregará um documento
oficial e definitivo em alguns meses.
Em todo caso, segundo o
próprio papa, em vídeo amplamente difundido, no momento o principal é assimilar
bem o diagnóstico que o Sínodo faz da situação da Amazônia e as urgências que
dele decorrem. Este é o encargo mais importante a ser completado neste
momento não apenas à Igreja, mas a toda a sociedade.
Maria Clara Bingemer é professora do Departamento de Teologia da
PUC-Rio e autora de “Mística e Testemunho em Koinonia” (Editora
Paulus), entre outros livros
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