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quarta-feira, 6 de julho de 2016

DE CASAMENTO “NO ESCURO”, VALIDADE DUVIDOSA, DIVÓRCIO


 Por Juracy Andrade



O papa Francisco, bispo de Roma, como ele se apresentou aos fiéis ao ser eleito, e não sucessor do imperador romano, continua a surpreender. Não faz muitos dias, falando a noivos, afirmou que uma grande maioria de casamentos sacramentais é nula e acrescentou que os jovens não devem casar somente porque a garota engravidou.

Interessante que, depois que eu amadureci mais e me libertei de muita coisa equivocada que os padres ensinam no seminário, passei a pensar assim. Retornei à vida civil convencido de que seria insensato tomar um compromisso (voto de celibato) para toda a vida sem conhecer como a vida é e sem ter garantia permanente do necessário carisma, que chamamos graça. Regra do direito canônico não é graça de Deus. Casei uns cinco anos depois, com pouquíssima condição financeira. A orientação era que só se devia ter relações sexuais no casamento. Nada de namorar pra valer, ficar, experimentar o que é a vida a dois; muito menos optar por uma vida de solteiro namorador.

Lembro aquela conversa (não lembro de quem é): “Pra toda parte aonde eu vou Maria vai / Ela sem eu ela se veste mas não sai / Já faz dez ano que nós temo esse xodó / Só podemo viver junto que nem dois num corpo só” (sic). Isso pode ser bom, mas é raríssimo.

Seguindo a orientação, casei sem condições financeiras e também sem conhecer o “produto” (conhecer no sentido bíblico da expressão). Mal suspeitava que, dali a uns dois anos, aconteceria a fatalidade do golpe civil-militar de 1964, que bagunçou por muito tempo a minha vida: andei preso, perdi o emprego na universidade e ficou difícil alguma pessoa alinhada com a ordem unida me dar emprego. Quis voltar para a Europa, onde estudara por uns cinco anos (obtive até uma bolsa através do cônsul francês Marcel Morin), mas minha então mulher não aguentava ficar longe de papai e mamãe ...

Obtive empregos precários em publicidade (Carol Fernandes, um amigo que morreu recentemente) e em sucursais de jornais do Sudeste. Mas um trabalho realmente compensador só apareceu em 1967 na Folha de S. Paulo, lá em Sampa. Em São Paulo, estava cheio de nordestinos vítimas do golpe e havia trabalho para todo mundo (as polícias, na época, não eram conectadas e assim lá éramos, para os milicos, santos homens e mulheres). Quase todo ano, a Abril lançava nova revista e ainda havia muitas outras editoras e jornais. Eu ganhava bem. Mas havia o mesmo problema que o que houve em relação à Europa: saudade de papai e mamãe ... É o caso de perguntar: um casamento assim tem validade? Precisou pintar aí um papa cristão para falar o que Francisco falou. Sem liberdade, conhecimento da realidade, não há validade.

Dada a falta de validade de um casamento “no escuro”, ambos os cônjuges têm o direito de contrair novo casamento. Ambos. Pois a mulher também pode casar “no escuro”, ignorando que o noivo é mulherengo, que é machista militante e não vai deixá-la trabalhar, que não vai querer ter filhos ou que vai enchê-la de filhos para folgar melhor. Daí a preocupação de Francisco com católicos (as) divorciados (as) e recasados (as).



Juracy Andrade é jornalista com formação em filosofia e teologia

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