Por Marcelo Barros
Na sociedade atual, as relações entre pais e filhos são
muito afetadas pela instabilidade social e econômica, assim como pela ausência de
referências culturais que, no passado, davam certa segurança à família. O dia
dos pais pode ser ocasião para repensarmos valores como a importância das
relações entre pais e filhos e a missão da família na sociedade.
Em 2014 e 2015, a Igreja Católica dedicou duas sessões
do Sínodo dos Bispos aos atuais problemas das famílias. Decorrente desse
processo, o papa Francisco publicou uma carta pós-sinodal denominada Amoris Letitia, A alegria do Amor. Nessa
carta, o papa insiste com os ministros da Igreja para entrarem em diálogo com
as famílias. Isso lhes permitirá colaborar para a unidade dos lares, mesmo na
diversidade.
Cada vez mais a sociedade se liberta da cultura
patriarcal. Isso é bom. No entanto, é importante que a figura paterna, antes
tão destacada, redescubra o seu papel junto aos filhos e à esposa. Todos nós temos
amigos, mas cada ser humano tem apenas um pai e uma mãe. Em seu tempo, São
Paulo escreve a uma comunidade que ele havia fundado: “Embora vocês possam ter
dez mil instrutores, não têm muitos pais. Só eu os gerei no Cristo” (1 Cor 4,
15).
Muitas vezes, as pessoas ainda idealizam como deveria
ser um bom pai ou uma mãe perfeita. Por ocasião do dia dos pais, ainda circulam
mensagens que falam de um pai maravilhoso que, dificilmente, na vida concreta, podemos
encontrar. Na maioria das vezes, as próprias condições de vida obrigam o homem
a trabalhar longe de casa e da convivência familiar. Quando em São Paulo e no
Paraná é tempo de colheita da cana de açúcar, ainda há cidades no interior do
Nordeste que se esvaziam de homens. Esses pais de família deixam casa, esposa e
filhos por um, dois ou três meses. É o preço da sobrevivência. Por outro lado,
hoje, no Brasil, uma em cada três crianças que nascem não têm como festejar o
dia dos pais. Não apenas por ser pobre ou por algum desastre natural que lhe
roubou o pai, mas porque na sua certidão de nascimento consta apenas o nome da
mãe. O pai natural não a assumiu como filho ou filha. Todos os anos, no Brasil,
aumenta o número de famílias
mono-parentais.
Atualmente, existem técnicas genéticas que garantem a
paternidade biológica para quem, por acaso, tenha alguma dificuldade. O mais desafiador
é viver a vocação de pai e assumir o acompanhamento progressivo de uma pessoa
que, para crescer e amadurecer como ser humano, precisa de um ambiente sadio
que comumente só o pai e a mãe, ou quem assume o seu papel, podem proporcionar.
Por isso, mesmo se a luta pela sobrevivência das famílias é, hoje, mais
desgastante do que antes, é fundamental garantir o diálogo entre pais e filhos/as.
Só através do diálogo, crianças e jovens podem ser educados e estimulados a desenvolver valores interiores,
assim como aproveitar melhor a benéfica fecundação entre escola e vida. A
escola cumpre um papel fundamental, mas o apoio afetivo do pai e da mãe é
indispensável para motivar a criança e o jovem a avançar no caminho da educação
integral.
Mesmo se o pai passa o dia fora de casa e ao voltar,
está cansado e, às vezes, ainda tem tarefas a cumprir, é importante que não
desista de cumprir também a função de educador de seus filhos e filhas. Ao acompanhar
efetivamente o filho e a filha no aprendizado permanente que a vida encerra, o
pai é chamado a colaborar para que seus filhos e filhas sejam seres humanos
completos. Ao fazer isso, todo pai pode constatar como o poeta Vinícius de
Moraes tinha razão no Poema Enjoadinho, ao afirmar que os filhos dão um
trabalho imenso, mas, ao mesmo tempo, “que felicidade, os filhos dão!”.
Para quem crê em Deus e busca viver uma
espiritualidade amorosa, ser pai e mãe é principalmente aceitar ser imagem e
parábola de Deus-Amor, principalmente para as pessoas que, em seu crescimento,
precisam desse apoio.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países
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