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quarta-feira, 2 de agosto de 2017

O MELHOR PARA RELIGIÃO E ESTADO É O LAICISMO CONSTITUCIONAL. RELIGIÃO-PARTIDO NÃO FAZ SENTIDO DESDE HÁ MUITO

por Juracy Andrade



Abordo aqui novamente o tema do Estado laico, que, no Brasil, é uma lei, ou melhor, preceito constitucional olimpicamente ignorado. 

Desde que o imperador romano Constantino decidiu, dentro do conceito antigo de religião do Estado, que o cristianismo seria a nova religião do Império Romano, a religião cristã perdeu sua velha prática baseada no “a Deus o que é de Deus, a César o que é de César”. Os bispos passaram à condição de nobres, o clero adquiriu privilégios descabidos, mosteiros enriqueceram esquecendo a pobreza evangélica. Inventaram que São Pedro tinha sido papa e usava anel (?!); até hoje se fala em “anel do pescador”. Coitado de São Pedro, arrastado quase a pulso para Roma por São Paulo. Se um papa havia, era Paulo.

Os papas passaram a ter um poder muito grande, inclusive material e territorial, que só terminou com a unificação da Itália, processo em que grande papel tiveram nossos Garibaldi e Anita. Resmungando muito, o papa ficou confinado ao Vaticano e achando que tinham cometido contra a Igreja um abominável pecado. Sempre confundindo a Igreja de Cristo com o papado. Já no século 20, o ditador fascista Benito Mussolini assinou com Pio 11 o Tratado de Latrão, pelo qual se criava o Stato della Città Del Vaticano, independente, e concedia-se extraterritorialidade a alguns edifícios romanos, como as basílicas maiores, a Universidade Gregoriana. (Quando estudei nessa universidade, comunistas perseguidos pela polícia, pois a Democrazia Cristiana não era assim tão democrática, nem tão cristã, se refugiavam ali correndo da Piazza della Pilota.)

Além disso, Mussolini concedeu uma indenização simbólica ao papa, que serviu para a criação de um Banco do Vaticano, curiosamente chamado de Istituto per le Opere di Religione (IOR). Francisco, um papa cristão, está procurando sanar as estripulias desse banco, que, sobretudo no reinado do monsenhor americano Marcinkus, envolveu-se com máfia e com assassinatos.

Atrelada ao poder político, a Igreja, através do papado, envolveu-se em iniciativas abomináveis, como as Cruzadas, a Inquisição. Já com o iluminismo e enciclopedismo, começou-se a propor uma separação entre Igreja e Estado, entre religião e política. Isso ocorreu em parte, antes, com a Reforma de Martinho Lutero, que pretendia apenas dar uma boa sacolejada em práticas delituosas do Vaticano, sobretudo a venda de indulgências e o excessivo peso do papado sobre os fiéis, maioria pobre. Mais adiante, Lutero aliou-se a príncipes alemães, uma contradição que conduziu às assim ditas guerras de religião.

Mas foi com a Revolução Francesa que o domínio político do papado caiu mesmo em desuso. Voltaire queria enforcar o último rei nas tripas do último padre. Não precisou. Aos poucos, a própria Igreja sentiu que seria muito mais autêntica com a separação.

No Brasil, a Constituição imperial ainda não havia se adaptado à Revolução Francesa. O catolicismo continuava sendo a religião oficial e o imperador tinha a palavra final sobre a nomeação de bispos. Só com a República, estabeleceu-se a separação constitucional da Igreja em relação ao Estado. Mas só teoricamente. Os bispos ainda resmungaram muito tempo e exigiram prioridades, até se darem conta de que a separação era muito melhor para ambos.


Quando as religiões cristãs dissidentes de Roma, sobretudo as neopentecostais, começaram a crescer em Pindorama, insufladas principalmente pela política estadunidense, que acha a Igreja Católica Romana demasiado esquerdista, é que voltou a confusão entre religião e política. Ironicamente, pois lá longe elas se ligam à Reforma Luterana. E o que vemos? As confissões protestantes (que hoje preferem ser denominadas evangélicas; será que o catolicismo não se funda no Evangelho?) têm seus partidos e fazem propaganda política com base na Bíblia. O que é absolutamente contraditório em relação a uma Constituição laica. O pior é que muitas das confissões ditas neopentecostais pregam uma Teologia da Prosperidade, que contradiz a Teologia da Libertação: recolhem muito dinheiro de fiéis, muitas vezes pobres, e se espalham por toda parte prometendo o paraíso na Terra. Infelizmente golpeando o laicismo constitucional.

 Quem quiser ter sua religião que tenha, mas sem colocá-la a serviço de partidos e fins político-partidários. Amém! Aleluia!

Juracy Andrade é jornalista com formação em filosofia e teologia.

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