Frei Betto
Não faço parte do time das
pitonisas. Prefiro guardar o pessimismo para dias melhores. Contudo, prevejo
tempos difíceis para o Brasil, a menos que a nossa indignação se transforme em
mobilização. Pelo andar da carruagem, nossa frágil democracia se encontra
ameaçada, e nossa liberdade de expressão, amordaçada.
Os sinais não são promissores.
Nada indica que a economia brasileira sairá em breve do atoleiro em que se
encontra. O número de desempregados passa de 13 milhões. As previsões do PIB
2019 encolhem a cada novo balanço. No início do atual governo acreditava-se que
cresceria 2,2%. Agora, se prevê 1,7%. O Brasil retrocede.
Ainda que alguma reforma da
Previdência seja aprovada (sem afetar os privilégios do andar de cima, é
claro), nada indica vir do exterior investimentos substanciais. Nosso país está
desacreditado. Quem se aventura a embarcar em um navio avariado? E há outras
opções mundo afora para os investidores. Preferem multiplicar seu capital em
economias robustas e confiáveis.
Como se sentir seguro sob um
governo que a cada dia se desdiz? Em menos de cinco meses desacreditou as
próprias promessas de campanha. O corporativismo e o viés ideológico falam
mais alto que a competência. Ministro que se preze deve vestir a farda de
recruta e engolir a seco as ordens do comandante. Não se admite o
contraditório, o pluralismo, o debate democrático.
Dança-se ao ritmo leninista:
um passo à frente, dois atrás. A embaixada brasileira transferida para
Jerusalém permanece em Tel Aviv. A soberania do país se dobra à suspensão
unilateral de vistos para estadunidenses. A cultura é sufocada pela falta de
recursos. As ações da Petrobras e do Banco do Brasil despencam, porque o
governo “não intervencionista” veta o aumento do diesel e a publicidade do
banco.
A grileiros, desmatadores e
invasores de terras indígenas é concedida licença para matar. Aos milicianos se
faz vista grossa. Aos corruptos amigos da família, silêncio. O que ao pai,
movido a arroubos, não convém manifestar, ao filho é transferida a tarefa,
ainda que ofensas ao general eleito vice do capitão.
O desmonte é geral. Conselhos
federais são extintos; não há médicos em muitas localidades antes atendidas por
cubanos; disciplinas que ensinam a pensar, como filosofia e sociologia, são
riscadas dos currículos; milícias são toleradas; índios são recebidos em
Brasília, não por autoridades abertas ao diálogo, mas pela Força Nacional, como
se um bando de feras evadidas da selva ameaçasse avançar sobre o Planalto.
O clima é de repúdio à
democracia. Até quando o STF e o Congresso Nacional serão tolerados? E a
liberdade de imprensa? Oitenta tiros do Exército assassinaram dois cidadãos
inocentes e o fato é considerado irrelevante.
Pelos corredores do governo disseminam o
medo e a insegurança. O ministro da Economia fala em obter R$ 1
trilhão com as reformas, e horas depois o presidente reduz para R$ 800 bilhões.
O secretário da Receita Federal acenou com novos impostos e foi desautorizado
no dia seguinte de sua entrevista. A lei do silêncio impera. Quem pretende se
agarrar à sua boquinha no governo que trate de fechar a própria. O atual
governo sabe destruir, mas não sabe construir.
As pesquisas comprovam que a
aprovação ao Planalto despenca a cada mês? Ora, puro “fake”, clama o governo.
Ele garante que a aprovação, como ótimo, é 98%! Exceto para 2% de gente
envenenada pelo marxismo cultural. Gente que não respeita a família, ainda que
o acusador tenha tido três. Gente que é a favor dos direitos dos homossexuais e
contra a liberação da posse e do porte de armas.
O rei está nu. Mas não convém
admitir isso em público. Cada cidadão que cubra seus olhos indignados com as
cores vivas dessa policromia ministerial em 22 tons de cinza.
Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do poder” (Rocco), entre
outros livros.
Copyright 2019 – FREI BETTO – Favor não
divulgar este artigo sem autorização do autor. Se desejar divulgá-los
ou publicá-los em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou
impresso, entre em contato para fazer uma assinatura anual. – MHGPAL –
Agência Literária (mhgpal@gmail.com)
http://www.freibetto.org/> twitter:@freibetto.
Você acaba de
ler este artigo de Frei Betto e poderá receber todos os textos escritos por ele
- em português e espanhol - mediante assinatura anual viamhgpal@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário