Por Marcelo
Barros
Há poucos dias, na 4ª feira, 15 de
maio, o Brasil foi sacudido por uma das maiores manifestações públicas dos anos
mais recentes. Em mais de 240 cidades brasileiras, estudantes, professores,
funcionários públicos e a população, em geral, foram às ruas e praças para
manifestar o seu desagrado pelas medidas propostas pelo atual governo contra a
educação e no desrespeito à autonomia das Universidades públicas.
No início de maio, os bispos
brasileiros, reunidos em Aparecida, em sua “mensagem
ao povo brasileiro” denunciaram “a opção por um liberalismo
exacerbado e perverso que vai contra as políticas sociais e favorece mais ainda
as desigualdades”. Denunciaram que as reformas propostas pelo governo e já em andamento,
como a trabalhista e a da previdência, têm aumentado o desemprego, (13 milhões
de desempregados e 29 em trabalhos precários). Denunciaram as ameaças que pesam
sobre os povos indígenas e o agravamento da crise ética, política e econômica. Claro
que pensaram também na grave crise ecológica e na realidade da Amazônia. Diante
dessa situação, é incrível constatar como os pobres resistem e teimam em lutar pela
vida. As organizações sociais, apesar de perseguidas, se fortalecem e se unem
na luta.
Desde algumas décadas, a caminhada
da libertação tem se fortalecido com o testemunho de irmãos e irmãs que deram a
vida nessa luta. Muitos desses/as mártires eram cristãos/ãs e morreram pela sua
consagração à missão no meio dos mais pobres e à fidelidade ao evangelho,
vivida em situação de conflito. Deram a sua vida pelos irmãos sofredores.
Outros desses homens e mulheres, assassinados na luta pela justiça, embora não
estivessem ligados a nenhuma Igreja ou religião são mártires, ou seja,
testemunhas do projeto divino da justiça e da libertação. Como afirmou Jesus no
evangelho: são bem-aventurados/as porque foram perseguidos/as por causa da
justiça (Mt 5, 1- 12).
Nesse mês de maio, celebramos a
memória de vários irmãos e irmãs que deram a vida na causa da justiça. Entre
outros/as que deram a vida pela causa da justiça, as comunidades cristãs
recordam dois, cuja memória é muito cara a todos nós. No dia 10 de maio de
1986, em Imperatriz (MA), era assassinado o padre Josimo Tavares, comprometido
com a luta dos lavradores. Nesse domingo, 26, completaram-se 50 anos do
martírio do padre Antônio Henrique Pereira Neto, coordenador de jovens da
arquidiocese de Olinda e Recife. Aos 28 anos, foi barbaramente assassinado por
paramilitares que, ao matá-lo, queriam
atingir o arcebispo Dom Helder Camara. Quem, como eu, teve o privilégio de
conviver com esses dois irmãos sabe que ambos eram movidos pelo Evangelho e se
sacrificaram para ser fieis à missão que Deus lhes deu.
No Brasil e em vários países do
continente, além dos/das mártires da luta pela terra, da luta dos índios pela
sua libertação, da defesa da natureza e direitos humanos, as comunidades têm
convivido diariamente com assassinatos de jovens nas periferias, com a droga e
o tráfico que traz tantos sofrimentos, riscos, violências... Cada vez mais, os mártires não são
mais apenas essa ou aquela pessoa e sim povos
inteiros crucificados.
De acordo com a fé cristã, Jesus
morreu na cruz para que ninguém mais seja crucificado. Quem crê em Jesus deve
se comprometer em fazer tudo para baixar da cruz os povos crucificados. Isso
significa concretamente apoiar projetos políticos comprometidos com o povo mais
pobre e mais críticos com relação ao Capitalismo dominante que, como diz o papa
Francisco, “esse sistema mata”.
Nos anos 80, no Chile, Ronaldo Muñoz
escrevia: “Toda injustiça e opressão
violenta ocorrem porque Deus não pode evitar. (...) Assumindo ele mesmo, por
amor, o mal e a injustiça ali onde mais doem, o Deus que se deixa crucificar
com o Crucificado e os crucificados de hoje, é ele que nos interpela se estamos
fazendo o máximo e o possível para transformar essa realidade. (...) Crer
juntos com os sofredores e oprimidos no Deus de Jesus Cristo dá sentido e força
para juntos viver e lutar”.
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