Por Marcelo
Barros
“A
vida em primeiro lugar” continua sendo o horizonte que dá sentido ao tema
fundamental do 25º grito dos excluídos que acontece nessa semana e
especificamente, em todo o Brasil, nesse 07 de setembro. Nesse ano, esse grito
em favor da Vida se concretiza em uma denúncia que partiu do papa Francisco, ao
dizer aos movimentos sociais: Esse
sistema mata! .
A articulação de pastorais e
movimentos sociais traduz isso ao colocar no cartaz desse 25º grito a voz de todo o povo pobre nas diversas
regiões do país: “Esse sistema não vale.
Lutamos por justiça, direitos e liberdade”. A intenção dos que coordenam
nacionalmente o Grito dos Excluídos é que nesse 25º ano se possa:
1º - resgatar o projeto que deu origem
e sentido ao Grito dos Excluídos.
2º - apontar caminhos a seguir nesse
momento atual, tão difícil para o nosso país.
Falar em grito é optar por
comunicação. É preciso reavaliar quem grita e para quem se grita. É preciso de
fato dar voz e vez aos mis pobres e excluídos. Infelizmente grande parte de
nosso povo pobre nem tem consciência de ser excluído e não se interessa por
gritar. Por isso, tão importante quanto o Grito que se realiza a cada 07 de
setembro, é o processo de formação e discussão com as bases que antecede o
grito e que dura praticamente o ano inteiro. Significa dialogar com os
movimentos sociais e através deles escutar as realidades que precisam ser
denunciadas no Grito. E não basta tomar consciência delas. É preciso saber como
lhes dar voz e fazê-las participar ativamente do Grito.
Evidentemente, quando se fez o
primeiro grito dos excluídos no ano de 1995 e os dias atuais, o Brasil mudou
muito. É preciso perceber essas mudanças para ver em que devemos mudar. Os/as
excluídos/as de hoje não são mais apenas os trabalhadores rurais e urbanos.
Desde 1995 para cá, a massa de desempregados aumentou muito. E há ainda muitos
excluídos pela cor de sua pele. Outros/as são excluídos/as por sua orientação
sexual. Nesse ano, em várias regiões do Brasil, povos indígenas estão
manifestando presença e gritando como vítimas de profunda exclusão social e
humana.
Ao grito dos excluídos humanos, temos
de expressar o grito incontido e mudo da mãe Terra agredida. Nesses dias,
choramos a destruição progressiva e escandalosa da Amazônia. E não basta
chorar. Apesar do papa Francisco ter proposto um Sínodo de bispos católicos do
mundo inteiro para tratar da Amazônia, no próprio Brasil, muitos bispos e
dioceses continuam alheios ao que está acontecendo. Quando se fala em “Vida em
primeiro lugar”, até agora, muitos pastores católicos e grupos de Igreja se
interessam apenas pela vida uterina e fazem passeatas pela vida contra o
aborto. É preciso integrar no Grito dos Excluídos a voz dos povos da Amazônia e
todos os seres vivos ameaçados pelas queimadas, pelo agronegócio e pelas
mineradoras que destroem a região. Que esse Grito dos Excluídos seja o grito da
terra e da natureza (criação de Deus) que, como diz o apóstolo Paulo, “geme e sofre como em dores de parto e
conosco espera a libertação integral de nossas vidas” (Rm 8, 22 ss).
Atualmente há certo consenso de que a
concentração e a caminhada do Grito não podem mais ter o estilo único de
comício político. A palavra deve ir além do discurso e tomar formas diferentes
de arte, gestos e música. Precisa da participação de grupos artísticos, de
profissionais do teatro, cantores/as e principalmente garantir um maior diálogo
com a juventude, principalmente juventude de periferia. Ainda hoje, no Brasil,
é uma tragédia o número de jovens de periferia, principalmente negros,
assassinados impunemente.
O projeto do Grito é de fato dar voz e
vez a essas pessoas e esses grupos excluídos da sociedade. E ao possibilitar
que gritem, que possam estar mais organizados em sua mobilização e saibam
exatamente não apenas a situação que estão denunciando, mas também e
principalmente, a organização social a que aspiram e desejam.
Apesar de ter nascido pela inspiração
de setores das pastorais sociais católicas e com apoio da CNBB (Conferência dos
bispos católicos do Brasil), a natureza do Grito dos Excluídos é ser laical e
aberta a todos os movimentos sociais. O papa Francisco tem sido um exemplo de
diálogo com representantes de diversos movimentos sociais para escutá-los e
acolher a sua palavra. Quando no final do encontro, o papa fala é para expandir
a voz dos movimentos, apoiá-los e lhes dizer que ele se sente com eles e elas
nesse caminho. É essa a proposta do evangelho que mostra Jesus inserido na
realidade do povo sofrido. Até hoje, ecoa a palavra do evangelho que afirma
sobre Jesus que ele “tinha compaixão e vivia a solidariedade com
o povo pobre porque eram como ovelhas sem pastor”( Mc 6, 34).
MARCELO BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 44 livros publicados, dos quais “O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede da Paz e Loyola. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
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