POR lEONARDO BOFF
O que vou escrever aqui será de
difícil aceitação pela maioria dos leitores e leitoras. Embora o que diga seja
fundado nas melhores cabeças científicas, que há quase um século, vêm pensando
o universo, a situação do planeta Terra e seu eventual colopso ou um salto
quântico para outro nível de realização, não penetrou, no entanto, na
consciência coletiva nem nos grandes centros acadêmicos. Continua imperando o
velho paradigma, surgido no século XVI com Newton, Francis Bacon e Kepler,
atomístico, mecanicista e determinístico como se não tivesse existido um
Einstein, um Hubble, um Planck, um Heisenberg, um Reeves, um Hawking, um
Prigogine, um Wilson, um Swimme, um Lovelock, um Capra e tantos outros que nos
elaboraram a nova visão do universo e da Terra.
Para iniciar cito as palavras do
prêmio Nobel de biologia(1974) Christian de Duve que escreveu um dos melhores
livros sobre a história da vida:”Poeira vital: a vida como imperativo
cósmico (Campus 1997):”A evolução biológica marcha em ritmo acelerado
para uma grave instabilidade. O nosso tempo lembra uma daquelas importantes
rupturas na evolução, assinaladas por grandes extinções em massa”(p.355). Desta
vez ela não vem de algum meteoro rasante como em eras passadas que quase
eliminou toda vida, mas do próprio ser humano que pode ser não só suicida e
homicida, mas também ecocida, biocida e por fim geocida. Ele pode pôr fim à
vida no nosso planeta, deixando apenas os microorganismos do solo que se contam
em quatrilhões de quatrilhões de bactérias, fungos e virus.
Em razão desta ameaçada montada pela
máquina de morte fabricada pela irracionalidade da modernidade, se introduziu a
expressão antropoceno, uma espécie de nova era geológica na qual a grande
ameaça de devastação se deriva do próprio ser humano (antropos). Ele interveio
e continua intervindo de forma tão profunda nos ritmos da natureza e da Terra
que está afetando as bases ecológicas que os sustenta. Segundo os biólogos
Wilson e Ehrlich desaparecem entre 70 a 100 mil espécies de seres vivos por ano
devido a relação hostil que o ser humano mantem com a natureza. A consequência
é clara: a Terra perdeu seu equilibrio e os eventos extremos o mostram
irrefutavelmente. Só ignorantes como R.Trump negam as evidências empíricas.
Em contrapartida, o conhecido
cosmólogo Brian Swimme que na Califórnia coordena uma dezena de cientistas que
estudam a história do universo se esforçam para apresentar uma saída salvadora.
En passant se diga que B. Swimme, cosmólogo e o antropólogo das culturas Thomas
Berry, publicaram, com os dados mais seguros da ciência, um história do
universo, do big-bang até os dias atuais (The Universe Story San
Francisco, Harpert 1992) conhecido como o mais brilhante trabalho até hoje
realizado. A tradução foi feita mas a tolice dos editores brasileiros predominou
e até hoje não foi lançado. Criaram a expressão a era ecozóica ou o ecoceno,
uma quarta era biológica que sucede ao paleozóico, ao mesozóico e ao nosso
neozóico. A era ecozóica parte de uma visão do universo em cosmogênse. Sua
característica não é a permanência mas a evolução, a expansão e a auto-criação
de emergencias cada vez mais complexas que permitem o surgimento de novas
galaxias, estrelas e formas de vida na Terra, até a nossa vida consciente e
espiritual. Não temem a palavra espiritual porque entendem que o espírito é
parte do próprio universo, sempre presente mas que num estágio avançado da
evolução se tornou em nós autoconsciente, percebendo-nos como parte do Todo.
Esta era ezóica representa uma
restauração do planeta mediante uma relação de cuidado, respeito e reverência
face a esse dom maravilhoso da Terra viva. A economia não é da acumulação mas
do suficiente para todos de modo que a Terra refaça seus nutrientes.
O futuro da Terra não cai do céu mas
das decisões que tomarmos no sentido de estarmos em consonância com os ritmos
da natureza e do universo. Cito Swimme:”O futuro será determinado entre aqueles
comprometidos com o Tecnozóico, um futuro de exploração crescente da Terra como
recurso, tudo para o benefício dos humanos e aqueles comprometidos com o
Ecozóico, um novo modo de relação para coma Terra em que o bem-estar de toda a
comunidade terrestre é o principal interesse”(p.502).
Se esse não predominar conheceremos
possivelmente uma catástrofe, desta vez efetuada pela própria Terra, para se
livrar de uma de suas criaturas que ocupou todos os espaços de forma violenta e
ameaçadora das demais espécies, que, por terem a mesma origem e o mesmo código
genético, são seus irmãos e irmãs, não reconhecidos mas maltratados e até
assassnados. Temos que merecer subsistir nesse planeta. Mas isso depende de uma
relação amigável para com a natureza e a vida e uma profunda transformação nas
formas de viver. Swimme ainda acrescenta:”Não poderemos viver sem aquele insightespecial
que as mulheres têm em todas as fases da existência humana”(p.501).
Essa é a encruzilhada de nosso tempo:
ou mudar ou desaparecer. Mas quem crê nisso? Nos continuamos a gritar.
*Leonardo Boff escreveu com o
cosmólogo Mark Hathaway O Tao da libertação sobre a nova cosmologia, Vozes
2010.
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