Marcelo Barros
Nesses dias, assistimos a Venezuela
resistir heroicamente aos ataques do Império norte-americano e à guerra de
desinformação que os órgãos de comunicação oferecem contra o que acontece nesse
país irmão. Por isso, é importante lembrar a herança que Simon Bolívar nos
deixou e a proposta atual do Bolivarianismo para a Venezuela e que pode ser
presente divino para todo o continente.
No início do século XIX, Simon Bolívar
reuniu um exército para libertar os povos do continente da dominação do império
espanhol e integrar os diversos países que se foram unindo em uma única pátria
grande. Criou a República da Grande Colômbia que unia Venezuela, Equador,
Bolívia, Chile, Peru e a atual Colômbia. Respeitava a autonomia de cada povo,
integrado na confederação. Chegou a ajudar no Caribe a consolidação da
independência do Haiti, primeiro povo libertado das Américas (1809).
Na Venezuela, durante toda a sua
história, o ideal bolivariano sempre foi aceito e admirado por pessoas de todas
as classes e de diversas correntes políticas. No entanto, a elite de todos os
países sempre encontra formas de pensar a independência para os ricos, mas não
para todos. No mundo, a Venezuela é o
segundo maior produtor de petróleo (logo abaixo do Golfo Pérsico). Durante quase
duzentos anos, uma pequena elite dominou a Venezuela, entregando o petróleo do
país aos Estados Unidos. A Venezuela, rica em petróleo, terra maravilhosa em
diversidade de regiões e climas, sofria com imensa desigualdade social.
Desde as últimas décadas do século XX,
sob a liderança de Hugo Chávez, o bolivarianismo ressurgiu como proposta de um
novo Socialismo democrático e com rosto latino-americano. Esse movimento de
retomada dos ideais do Libertador assumiu três metas importantes: 1 - A integração de todos os povos e estados
latino-americanos. 2 - A libertação de todos os colonialismos. 3 - A redução
das desigualdades sociais na direção de um novo Socialismo democrático e a
partir dos mais pobres.
Na primeira década desse século, mesmo
adversários do governo bolivariano, reconheciam que nunca na Venezuela nenhum
governo fez tanto pelos mais pobres. O governo implementou um plano de educação
para todos, habitação digna e reforma agrária para os lavradores. Um profundo
respeito e maior protagonismo social para as comunidades indígenas e
afrodescendentes. Maior igualdade de gênero e complementariedade entre homem e
mulher.
O governo bolivariano nacionalizou a
maior riqueza do país, o petróleo. Determinou que todo o lucro vindo da venda
do petróleo servisse à educação, construção de moradias e saúde da população
mais pobre do país. Em 2002, a FAO declarou a Venezuela como país livre da fome
e do analfabetismo. Dois anos depois, a ONU reconheceu oficialmente que a
Venezuela Bolivariana tinha conseguido o índice de menor desigualdade social na
América Latina.
A elite que deixou de lucrar 400 % ao
ano e o Império que perdeu sua hegemonia no continente não se conformaram. Principalmente,
depois da morte do presidente Chávez (2013), a luta do Império e da elite
venezuelana contra o bolivarianismo se acentuou. Comerciantes bloqueiam
mercadorias e o Império construiu um bloqueio econômico para asfixiar o país,
além da desinformação e todo tipo de mentiras contra o governo bolivariano. O
resultado é um país dividido e extremamente violado pela guerra comercial
desonesta e pela propaganda. Apesar de toda essa violência e da realidade
difícil que os pobres enfrentam, o povo resiste heroicamente e o governo
democrático ganha todas as eleições.
A respeito da integração
latino-americana, em julho de 2011, em Caracas, liderados pelo presidente Hugo
Chávez, 33 representantes de países irmãos criavam oficialmente a Comunidade
dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC) que reúne 33 países da
América do Sul, América Central e Caribe
em um caminho de cooperação solidária, integração continental e autonomia
frente ao Império.
O Império norte-americano financiou a
vitória da direita em vários países latino-americanos e colaborou diretamente
com o golpe que derrubou a democracia no Brasil. Assim, os organismos de
integração latino-americanos foram destruídos ou simplesmente ignorados. No
Brasil, na Argentina e em outros países, governantes voltam a bater continência
à bandeira do Império e a ele entregar de graça todas as nossas riquezas.
Para irmãos e irmãs solidários com a
Venezuela e que desejam a integração latino-americana, posso testemunhar duas
coisas:
1 – A primeira é que defender o
Bolivarianismo não é apenas defender o governo venezuelano. É assumir uma
proposta que vem das bases do povo, das comunidades indígenas e
afrodescendentes. Em uma de suas circulares, dirigidas a um grupo de amigos e
auxiliares, já em 1965, na época do Concílio e escrevendo em Roma, Dom Helder
Camara defendia o Bolivarianismo, ao qual o papa Francisco também já aludiu com
simpatia.
2 – Mesmo quem tem críticas ao governo
venezuelano pode saber que a oposição atual na Venezuela é dez vezes pior em
todos os aspectos do que o governo que ela combate e a eventual vitória da
oposição fecharia para toda a América Latina qualquer possibilidade de
autonomia diante do império norte-americano.
Por tudo isso, é responsabilidade de
quem nutre uma espiritualidade libertadora, assumir mesmo que seja criticamente
um apoio aos movimentos libertadores latino-americanos.
Em 1815, Simon Bolívar, o libertador
da pátria grande que é a América do Sul, em sua “Carta de Jamaica”, considera o
elemento religioso como aglutinante da alma americana e formula “a necessidade urgente de uma união de nossos
povos, ligados por elementos culturais e religiosos comuns”. Assim, 236
anos depois do nascimento de Simon Bolívar, nesse 24 de julho, com todo o
coração e nossa solidariedade ao povo da Venezuela, somos convocados/as para
gritar: Viva Simon Bolívar, viva o Bolivarianismo!
MARCELO BARROS é
monge beneditino e escritor. Tem 44 livros publicados, dos quais “O Espírito
vem pelas Águas", Ed. Rede da Paz e Loyola. Email:
irmarcelobarros@uol.com.br
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