por Frei Betto
Inicia-se mais um ano. Hora de relembrar, examinar, avaliar. E fazer propósitos
para os próximos doze meses: comer menos, fazer exercícios, ser mais generoso,
esbanjar elogios, votar nas eleições municipais em quem realmente se dedique a
assegurar qualidade de vida à população... Dentro do coração latejam anseios de
vida e mundo melhores. Como alcançá-los?
Quem sou eu para dar conselhos! Conheço o tamanho de minhas falhas, a dimensão
de meus erros. Nem por isso deixo de partilhar com os leitores meia dúzia de
opiniões que, se carecem de fundamento, ao menos aquecem o debate.
Saudade. Vocábulo português sem similar em muitos idiomas. De que temos
saudades? Do amor perdido? Da infância feliz? Do parente falecido? Sim, mas
sobretudo de nós mesmos.
Talvez o fim e o início do ano sejam os momentos em que mais aflora a
disposição de fazer exame de consciência. Saudade de estar exilado do que
realmente sou. Tem saudade de si quem anda exilado do que realmente é.
Corre-se o risco de ter como epitáfio o verso de Fernando Pessoa: “Fui o
que não sou”. Não quero ser o que não sou. Mas admito a pertinência das
palavras do apóstolo Paulo: “Faço o que não aprovo; pois o que aprovo não faço”
(Carta aos Romanos 7,15)
É hora de pagar o nosso resgate. Livrar-nos da condição de refém
insatisfeito de nossos próprios vícios e incoerências. Resgatar-se é
empreender árdua jornada rumo à própria interioridade. Não apenas como fez De
Maistre dentro do próprio quarto. Mas ir aonde reside a verdadeira identidade –
ao mais profundo de si.
Como fazê-lo? O processo psicanalítico é, nesse caso, de grande valia.
Entretanto, implica recursos nem sempre ao alcance de todos. Faço, pois,
singela proposta: meditar. Eis um caminho viável a todos. Bastam disposição e
tempo. Vontade e método.
Lido há anos com grupos de oração. Com eles aprendo lições importantes
concernentes à meditação. Não existe um único método. São tantos quantos os
meditantes. Cada pessoa deve descobrir e desenvolver o método que lhe convém:
sentado ou andando, de olhos fechados ou entreabertos, ao acordar ou no fim da
tarde, em silêncio ou ao som de uma suave melodia, concentrado no mantra ou na
respiração etc.
Um detalhe é importante: reservar tempo à meditação, assim como se faz à refeição, ao sono e ao banho. Sem criar na agenda espaço específico para isso, fica difícil.
Um detalhe é importante: reservar tempo à meditação, assim como se faz à refeição, ao sono e ao banho. Sem criar na agenda espaço específico para isso, fica difícil.
É preciso ter disposição. Saber “perder tempo”. Livrar-se da ideia utilitarista
de que “tempo é dinheiro”. Mergulhar, por um momento, no saudável espaço da
ociosidade espiritual. Disposição significa disciplina. Não se medita sem se
dar tempo.
Aos iniciantes recomenda-se marcar no relógio um tempo mínimo de meditação.
Sugiro 20 minutos. Enquanto o despertador não soar, não mude a postura
escolhida para meditar. Aos poucos, aumenta-se o tempo, na mesma proporção que
se consegue esvaziar a mente e centrar a atenção no plexo solar, embebendo-o da
presença inefável de Deus. Ou do Vazio.
O que fazer para melhorar o mundo? Há pequenos gestos, como observar normas de
lixo seletivo, economizar água e energia, plantar árvores e defender a
preservação do meio ambiente. Há gestos mais amplos, como associar-se a um
esforço comunitário, seja em igreja, sindicato, clube, ONG ou iniciativa
voltada à responsabilidade social. Vínculos de solidariedade se estreitam
através de trabalhos voluntários, lutas partidárias, pressões sobre o poder
público ou denúncias de abusos de empresas, como anúncios lesivos às crianças
ou produtos com altas doses de substâncias prejudiciais à saúde, como
embutidos, transgênicos e placas de amianto.
O mundo é o que dele fazemos. E nele interferimos por participação ou omissão. Não existe neutralidade. Isso vale para a nossa saúde pessoal e coletiva. A indiferença não faz a diferença.
O mundo é o que dele fazemos. E nele interferimos por participação ou omissão. Não existe neutralidade. Isso vale para a nossa saúde pessoal e coletiva. A indiferença não faz a diferença.
Frei Betto é escritor, autor de “Por uma educação crítica e participativa” (Rocco), entre outros livros.
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