Prof. Martinho Condini
Há um ano, João Alberto Silveira
Freitas morreu após ser brutalmente espancado por seguranças no estacionamento da
loja do Carrefour, em Porto Alegre.
A diferença entre a morte de
milhares de negros e negras que já ocorreram neste país, com a morte de João
Alberto é que a sua foi filmada e colocada nas TVs e nas redes sociais. Cidadãs
e cidadãos dessa sociedade do espetáculo assistiram a pavorosa cena, o que
gerou vários protestos pelas principais cidades do Brasil.
Os réus respondem na justiça por
homicídio triplamente qualificado: por motivo torpe, asfixia e recurso que
impossibilitou a defesa da vítima, com dolo eventual.
Os que espancaram João Alberto
estão presos, a fiscal da loja está em prisão domiciliar e alguns seguranças e
funcionários que não participaram da ação, mas se omitiram em proteger João
Alberto respondem a ação em liberdade.
O processo criminal ainda não foi
concluído, apesar das imagens.
A loja em que ocorreu esse
trágico acontecimento, foi punida? O
Carrefour Brasil tomou alguma medida propositiva em relação às questões
antirracistas em suas lojas espalhada pelo território brasileiro?
Por mais incrível que possa parecer,
a empresa durante o ano de 2020/2021 realizou políticas antirracista com ações
práticas no intuito de contribuir não só com o processo de conscientização do
problema racial, como também com ações educativas e criação de oportunidades de
trabalho e estudo para jovens negras e negros.
Mas claro que essas ações por
parte da empresa só ocorreram devido a pressão e protestos da sociedade civil,
que começaram a fazer saques em suas lojas e campanhas para que as pessoas não
freqüentassem mais as lojas dessa rede de supermercados.
Essas ações positivas realizadas
pela empresa não trarão João Alberto de volta, nem acabará com o racismo numa
sociedade conservadora,retrógrada e racista como a brasileira, mas são
realizações importantes que poderão incentivar outras empresas a ter atitudes
semelhantes de políticas antirracistas, sem ter que esperar que outros Joões Albertos sejam brutalmente assassinados.
Desde de o acontecido a empresa
assumiu compromissos públicos e criou um Fundo Antirracista, no valor de 115
milhões de reais com validade de três anos. O Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC) com o Ministério Público teve um aporte inicial de 25 milhões de reais e
os resultados das vendas dos dias 20,26 e 27 de novembro 2020.
O Fundo Antirracista realiza
ações internas de combate à descriminação racial e promoção da equidade, ações
de mobilização da rede de fornecedores/parceiros e ações de impacto na
sociedade, principalmente empregabilidade, educação e empreendedorismo de
pessoas negras.
Os investimentos são destinados
prioritariamente às bolsas de educação formal e de
qualificação profissional, empreendedorismo e projetos socioculturais, além de
campanhas educacionais. Todas essas ações sem dúvida são importantes.
Mas não podemos nos
esquecer que 56% da população brasileira é negra e a luta é diuturna contra o
racismo estrutural (enraizado nas mais profundas entranhas da nossa sociedade),
que infelizmente ainda permanece em nossa sociedade.
Enquanto na cultura
brasileira prevalecer a ética da
branquitude, onde as práticas racistas não são vistas como racismo, e sim
como um comportamento natural na sociedade, afinal
de contas foi sempre assim, não há nenhuma possibilidade de se baixar a
guarda diante desse contexto racial e preconceituoso que nos aflige a séculos.
As atitudes positivas tomadas
por essa empresa talvez seja um alento
diante de tanto sofrimento, desigualdade e injustiça.
As práticas antirracistas
devem permanecer na mente e corações de todos os sujeitos envolvidos de alguma
maneira nessa luta contra o racismo estrutural.
Viva o Dia da Consciência Negra. Que
esse seja mais um dia de luta e reflexão, conforme foram os outros 364, com uma
diferença: hoje João Alberto será lembrado e homenageado, pois se tornou um
símbolo da resistência negra contra o racismo e preconceito no Brasil.
O Prof. Martinho Condini é historiador, mestre em Ciências da Religião e
doutor em Educação. Pesquisador da vida e obra de Dom Helder Camara e Paulo
Freire. Publicou pela Paulus Editora os livros 'Dom Helder Camara um modelo de
esperança', 'Helder Camara, um nordestino cidadão do mundo', 'Fundamentos para
uma Educação Libertadora: Dom Helder Camara e Paulo Freire' e o DVD ' Educar
como Prática da Liberdade: Dom Helder Camara e Paulo Freire. Pela Pablo
Editorial publicou o livro 'Monsenhor Helder Camara um ejemplo de esperanza'.
Contato profcondini@gmail.com
Mestre Martinho, meus parabéns. Viva Zumbi dos Palmares!
ResponderExcluirCaríssimo, amei a reflexão! Gratidão
ResponderExcluirMuito bom.
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