Marcelo Barros
Chegamos a dezembro de um ano profundamente
problemático. No ponto de vista social e político, o Brasil parece ter chegado
ao fundo do poço. A pandemia que, desde o início de 2020 nos ameaça, se
transmuta em novas cepas e variantes. A Amazônia e todos os biomas brasileiros sofrem
invasões e destruição como jamais antes tinham vivido.
A proximidade do final do ano leva as Igrejas a pensar
no que será a meta da história. No tempo antigo, essa idéia tomava a imagem de “fim
do mundo”. Vários mitos falam sobre isso. A Bíblia, inserida na antiga cultura
judaica, não escapa desse assunto. Os profetas antigos prometem para o final
dos tempos um julgamento final da humanidade e uma intervenção de Deus para
fazer justiça e libertar os oprimidos. Conforme
os evangelhos, Jesus tomou esse tema para um de seus discursos (Mt 24, Mc 13,
Lc 21). Assegurou que não se trata tanto do fim do mundo e sim do fim de um
período da história e que dará lugar a um novo tempo no qual a própria
humanidade (o homem novo e a mulher nova) será cheia da energia amorosa de
Deus.
Há quem interprete as guerras e desastres ecológicos
atuais como se tivessem sido previstos na Bíblia. Ao contrário, muitos crentes
sabem que a história tem sua autonomia. A presença divina não é para destruir e
sim para renovar. Se, por acaso, a terra caminhar para o fim da vida no seu
solo, isso acontecerá não por decisão divina e sim por culpa da sociedade
dominante que transforma a terra e a natureza em mercadoria e, além de tudo, fabrica
artefatos nucleares capazes de destruir a humanidade e todo o planeta.
O fim do mundo não é projeto de Deus e não foi isso
que as profecias anunciavam. Jesus falou do fim de um mundo. Profetizou a
derrota de uma sociedade injusta. Para quem vivia oprimido, o anúncio da
destruição daquela velha ordem e a instauração de uma nova realidade mais justa
e amorosa só podia ser boa notícia. Era um verdadeiro evangelho. Uma das
figuras usadas para falar da renovação do mundo é o do parto. Na época antiga,
as dores de parto representavam o sofrimento necessário para o surgimento de
uma vida nova. Por isso, Jesus conclui o anúncio do fim daquele mundo dizendo:
“Quando essas coisas começarem a
acontecer, levantem-se, ergam a cabeça e se alegrem, porque é a libertação de
vocês que se aproxima” (Lc 21, 28).
Atualmente, sabemos que esse processo de parto da
história não é reservado para uma época final. Ele se dá cotidianamente e em
todos os níveis da nossa realidade social e política, assim como no âmbito de
nossas relações humanas e nosso crescimento interior.
O amor divino inspira, mas não realizará essa
transformação estrutural do mundo e da sociedade sem ser através de nós e de
nossa ação solidária. Essa nossa transformação interior é como semente e base
da transformação do mundo. Por isso, Paulo escreveu aos irmãos e
irmãs de fé que viviam em Roma: “Não se
conformem com este mundo, mas busquem se transformar pela renovação de suas
mentes para discernir qual é a vontade divina” (Rm 12, 2).
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