Por MARCELO BARROS

Em
tempos muito antigos, a Páscoa era uma dança da primavera e que fazia as
pessoas participarem da renovação da natureza no hemisfério norte. Mas mesmo no
sertão do Nordeste do Brasil, essa é a época das tão esperadas chuvas e é
costume cantar na Páscoa um hino que vem de séculos antigos: “Cristo
ressuscitou, o sertão se abriu em flor, da pedra, água surgiu, era noite e o
sol raiou, aleluia!”. Essa esperança é o que as Igrejas cristãs celebram nessa
semana pascal e ainda por 50 dias como se teimassem em transformar o cotidiano
da luta em uma energia de festa permanente.
Na
noite do sábado passado ou madrugada do domingo, na grande Vigília pascal, mais
importante celebração da Igreja durante todo o ano, as comunidades escutavam um
evangelho que narra a corrida das mulheres, amigas de Jesus ao seu túmulo, “na
madrugada, quando o sol ainda não havia nascido” (Cf. Lc 24, 1). Essa é a
melhor imagem da Páscoa: uma madrugada ainda escura na qual temos certeza de um
amanhecer esplendoroso e brilhante. Aurora de um mundo novo, presente do amor
divino ao universo que se realiza em nós e toma a forma de uma organização
social mais justa e fraterna. Nesses dias, em Túnis, na Tunísia, homens e
mulheres, cidadãos de vários países e ligados às mais diversas tradições
religiosas ou a nenhuma encerraram mais um fórum social mundial no qual tomaram
como bandeira comum: “um novo mundo é possível!”. Essa palavra é a tradução
civil e laical correspondente ao que os cristãos proclamam em sua fé: O Cristo
ressuscitou realmente e assim Deus inaugurou uma nova criação da qual nós
fazemos parte e somos chamados a ser testemunhas.
Quando
olhamos a realidade do mundo, constatamos a urgência de que o escuro da
madrugada se transforme em luz do dia. Ansiamos por uma economia mais justa e
transparente. Em nosso país, queremos uma organização social e política mais
participativa. E precisamos de um novo modo de nos relacionar com a natureza. A
aurora do dia tem seus mistérios. Se vai raiar um dia de sol ou a manhã será
chuvosa e feia, não depende de nós. A aurora social e humana, sim. Podemos
ajudar a que a madrugada ainda escura de nossa realidade se transforme em dia
ensolarado da justiça e da fraternidade. Isso é Páscoa. Fazemos isso ao
participarmos de todo esforço social por um mundo mais justo, mas também no
nosso dia a dia ao tornarmos mais amorosas nossas relações com as pessoas. No
Oriente, nesses dias, os cristãos recordam a memória de um santo monge que foi
uma espécie de Francisco de Assis russo. Viveu no século XIX e se chamava
Serafim de Sarov. Vivia em uma floresta e cada vez que em seu caminho
encontrava alguém, se curvava diante do desconhecido e dizia: “Ao ver você,
constato que verdadeiramente Jesus ressuscitou e atua em você fazendo de você
uma pessoa nova. Graças a Deus!”.
Marcelo
Barros, monge beneditino e peregrino de Deus
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