por Frei Betto
No final da década de 1920, o escritor romeno Panait Istrati visitou a União
Soviética. Testemunhou, horrorizado, os expurgos de Stálin. Um dirigente
comunista tentou convencê-lo de que era necessário o uso de tanta violência
para construir o socialismo: “Não se pode fazer omeletes sem quebrar os ovos.”
O romeno retrucou: “De acordo. Vejo ovos quebrados. Mas onde estão as
omeletes?”
Guardadas as proporções, é o que faz o governo Temer. Quebra ovos em quantidade
sem a menor perspectiva de oferecer omeletes à maioria da população. Sem
dúvida, não faltarão ovos nevados para a minoria abastada que vive de
especulação financeira.
O que se vê é aumento do desemprego e dos direitos de cidadania. As medidas de
austeridade equivalem ao argumento religioso de que estamos todos marcados pelo
pecado original.
Portanto, de todos é exigido fazer penitência... menos dos
mais ricos. O Estado é, hoje, o novo Moloch, a quem devemos oferecer
sacrifícios...
Golpe consumado e uma vez empoderados, Temer e seu ministério erguem foices
sobre os direitos dos trabalhadores: redução dos investimentos em educação e
saúde; mudanças na aposentadoria rural; redução nos direitos previdenciários
dos professores; ataque à política do salário mínimo, inclusive a desvinculação
do mínimo como piso da Previdência Social.
O rombo fiscal já foi ampliado de R$ 97 bilhões (Dilma) para R$ 170 bilhões
(Temer). Segundo a insuspeita senadora Kátia Abreu, R$ 50 bilhões apenas para
bancar o golpe. Para 2017, preveem-se novo rombo de R$ 139 bilhões e aumento de
impostos para mais arrecadações.
Não é só no social que os prognósticos são ameaçadores, mas também na
estratégia global de retorno à dependência aos EUA e de privatização do pouco
que resta do patrimônio brasileiro, de aeroportos ao pré-sal.
Em termos de mercado de trabalho, o Brasil apresentava índices positivos até o
final do primeiro mandato do governo Dilma. Então, aconteceu uma virada na
política econômica sob o pretexto de que o país necessitava de um ajuste
fiscal, tendo como consequências um choque monetário com enorme aumento de
juros, que passou de 11% para 14%, e uma política irresponsável de preços
administrados. Como se o preço da gasolina e da energia não influenciassem
todos os demais em uma economia tão indexada como a brasileira. Resultado:
dispararam a inflação e o desemprego.
O remédio adotado por Dilma na virada do seu primeiro para o segundo mandato
foi amargo, e agravou a situação econômica brasileira ao transformá-la em
recessão. O baixo crescimento da economia se converteu em profunda depressão, a
maior desde a década de 1930.
Agora, o governo Temer aprofunda as medidas restritivas iniciadas por Dilma em
seu segundo mandato. E o que é grave, sem uma estratégia de longo prazo para o
Brasil, dependente apenas de meras táticas fisiológicas para acomodar aliados
na máquina estatal e recolher dividendos eleitorais.
Frei Betto
é escritor, autor de “Reinventar a vida” (Vozes), entre outros livros.
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