Por Cesar Kuzma
A
pessoa de Francisco e o modo de pastorear a Igreja que ele nos oferece têm-nos
servido de inspiração e de testemunho para muito daquilo que estamos buscando e
tentando construir eclesialmente, seja em âmbito interno, naquilo que tocam as
estruturas, seja em âmbito de missão, e, como base de tudo isso, pensando na
proposta do próprio Papa, uma Igreja em
saída. Podemos dizer o mesmo em relação à sociedade, pois Francisco retoma às
intenções do Vaticano II e propõe um diálogo autêntico e livre, em que os grandes
dramas e tramas humanos, as grandes causas e problemas sociais atuais são
tratados e aproximados da missão da Igreja.
Uma característica que percebemos na
sua Exortação Evangelii gaudium (EG), por exemplo, é o modo como ele
aborda o conteúdo da expressão evangelizar.
Ele diz que se trata de uma ação de alegria,
que resulta de uma sensação que contagia todo o nosso ser e que, por essa
razão, transborda e vai ao encontro do outro, da outra, e de todas as
realidades, à todas as periferias [existenciais e sociais]. Esta alegria não
vem de um simples entusiasmo humano ou de mera experiência, por mais
importantes e reais que elas sejam, mas nasce de um encontro vivo e real com
Jesus Cristo, o ressuscitado. É um encontro que marca o nosso ser e a
experiência que se produz modifica a nossa estrutura, naquilo que somos e
naquilo que somos chamados a ser, pois passamos a ver de forma diferente. Este ver, que aparece nas narrativas
bíblicas da ressurreição e que aqui é trazido como uma ação que permite esta
experiência, é muito mais que olhar, ele abre novos horizontes e possibilidades.
A
partir deste encontro, nós passamos a dar nova razão e sentido às experiências
que trazemos e somos motivados por um novo ar de esperança, que faz tudo
parecer novo (EG 11). E isso, mesmo diante das adversidades e tribulações, das
condições concretas que nos cercam, já que esta é uma alegria que nos coloca
diante de uma realidade transcendente que se faz valer pelo imanente da
história, por aquilo que é real e concreto, com toda a sua problemática e
questões urgentes, diante de toda dor e sofrimento, de questões de vida e de
morte, pois não há fuga, mas presença,
vivência e anúncio. Esta nova sensação produzida pelo encontro na fé,
que faz brotar esta alegria, esta força de esperança, não pode ser confundida
com alienação ou simplesmente êxtase religioso, mas sim de um brotar da fé que
se faz compromisso, que implica postura e que avança para uma esperança
responsável, cativa, crítica e criativa. O ressuscitado que encontramos não é
outro senão o crucificado. Ele nos deixou um caminho de seguimento que nos
convida a um Reino, ao serviço, ao cuidado do outro e a construção do bem comum;
e esta experiência, este entendimento, isto é, esta percepção, é vital para o
cristão.
Esta é a fonte da alegria que deve
estar presente no olhar do evangelizador, de todo cristão. É a alegria diante
de um futuro que nos chama a novas realidades e, ao mesmo tempo, nos compromete
com aquilo que está a nossa frente, com situações e pessoas concretas, com
dores e sofrimentos, angústias e esperanças; situações limites que não se pode
ignorar, pois elas nos obrigam a um olhar prioritário.
Todos
somos chamados a esta ação, a uma saída. Ela deve ser real e concreta.
Teólogo leigo, casado e pai de dois filhos. Doutor em Teologia e professor-pesquisador do Departamento de Teologia da PUC-Rio. Presidente da SOTER (Sociedade de Teologia e Ciências da Religião).
* Este artigo foi publicado originalmente no Portal das CEBs : http://portaldascebs.org.br/2020/10/20/chamados-a-acao-a-uma-igreja-em-saida-por-cesar-kuzma/
Nenhum comentário:
Postar um comentário