Maria Clara Lucchetti Bingemer
O Papa Francisco tem
demonstrado muitas qualidades e virtudes ao longo de seus nove anos de
pontificado. Diferentes pessoas e instâncias têm apreciado e elogiado
publicamente sua sensibilidade humana e pastoral, sua inteligência que responde
prontamente às perguntas difíceis ou mesmo insidiosas de jornalistas e
curiosos, sua capacidade de pensar de forma ampla e grande os problemas do
mundo e as crises pelas quais passa a humanidade neste século XXI.
Sob
sua liderança, a Igreja Católica – que ele sempre desejou “em saída” –
ultrapassou realmente o nível eclesiástico como único fórum de diálogo e ganhou
as praças, as ruas, os espaços acadêmicos, as instituições seculares.
Enfim, por todo o planeta, entre católicos e não católicos, crentes e não
crentes, a figura de Francisco é respeitada e ouvida como única liderança
positiva existente na atualidade.
Por
outro lado, não são poucos igualmente os inimigos do Papa que, aberta ou em
segredo, militam incansavelmente contra suas iniciativas. Minam Francisco
como pessoa, suas propostas, fazem movimentos que são obstáculos aos movimentos
por ele iniciados, acusam-no infundadamente. E, sobretudo, adotam uma atitude
de silêncio mal-intencionado, interpretado como macabra aposta que o Papa,
agora com 84 anos, envelhece e seu pontificado não deve durar muito. Nos bastidores
correm nomes sobre seu possível sucessor.
No
entanto, os detratores de Francisco fazem mal em não levar em conta uma das
virtudes mais importantes do Papa: seu gênio estratégico. Bergoglio é
alguém que pensa e vê longe. E age em consequência. Por isso, vem
realizando desde o início de seu tempo à frente da igreja de Roma e como chefe
da Igreja Católica uma reforma já iniciada com decisões pontuais e
significativas.
É
assim que a nomeação dos bispos com “cheiro de ovelha”, de perfil mais pastoral
e mais próximos ao povo começa a ser visível e apresentar volume e espessura
nas fileiras episcopais. Do mesmo modo, as nomeações de cargos importantes de
coordenação e decisão dentro da cúria romana: de mulheres, leigos e outros
segmentos representativos do povo de Deus, que até então permaneciam fora deste
corpo que faz funcionar o cotidiano da Igreja Católica.
Criou
também novos dicastérios, extinguindo outros ou reagrupando-os por
afinidade. Assim, foi promovendo um certo “enxugamento” de uma cúria que
se encontrava pesada devido à existência de uma multiplicidade de organismos e
setores para além de suas necessidades reais e, sobretudo, pastorais. Por trás
da estratégia do pontífice pode-se vislumbrar o desejo de que uma cúria mais
ágil e enxuta sirva melhor ao único propósito da existência da Igreja, qual
seja, o de anunciar o Evangelho.
Como
confirmação do que se diz acima, no último dia 19 de março, festa de São José,
foi anunciada uma nova Constituição Apostólica sobre a Cúria Romana e seu
serviço à Igreja e ao mundo. A nova Constituição entrará em vigor a partir do
domingo, 5 de junho, festa de Pentecostes. Seu título diz muito sobre o
conteúdo e principalmente a respeito da intenção e objetivo com os quais é
promulgada: Praedicate
evangelium.
O
Papa não reforma a cúria apenas pelo desejo de reformá-la ou mesmo para
afastá-la do que fizeram seus predecessores. Reforma-a para que
possa realizar melhor seu serviço por excelência, que é a pregação do
Evangelho, o anúncio da Boa Notícia de Jesus Cristo ao mundo de hoje. E a festa
de Pentecostes é escolhida propositalmente para a entrada em vigor dessa
reforma tão esperada e por fim realizada: é a festa da liberdade e da abertura
universal. A festa na qual o Espírito, como artífice da linguagem total,
quebra as barreiras linguísticas e semânticas, rompe as barreiras das
diferenças e abre ouvidos e línguas ao diálogo e ao entendimento.
Uma
cúria pesada e carregada de excessivas estruturas não ajuda a esse diálogo que
Francisco vem tentando incansavelmente realizar. Uma cúria reformada,
mais enxuta e mais leve, seguramente será um instrumento poderoso para abrir
caminhos e corações na direção de mais vida para todos, construindo uma
fraternidade universal onde todos os seres vivos possam chegar à vida em
plenitude.
É
hora de aplaudir e louvar o pontífice por sua estratégia que não recua diante
de nada que possa ajudar a Igreja a realizar o sonho de Jesus: o Reino de paz,
justiça e amor.
Somos agradecidíssimos, Santo Padre. Siga em frente e conte com
nossa oração e nossa colaboração. Amém.
Maria Clara Bingemer, professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio
e autora de Santidade: chamado à humanidade (Paulinas
Editora), entre outras obras.
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