Por Marcelo
Barros
Pela
primeira vez na história, diversas Igrejas cristãs e até outras religiões se
unirão nessa semana para orar e meditar sobre o cuidado com a Terra, a água, o
ar e todo o universo no qual nós, seres humanos somos inseridos e ao qual
pertencemos. Desde a década de 70, a cada ano, o patriarca de Constantinopla
propõe que todas as Igrejas Orientais dediquem o 1o de setembro como "dia de oração e
cuidado com a Criação". Em agosto do ano passado, o papa Francisco enviou
uma carta a todas as dioceses pedindo que a Igreja Católica também se una a
essa celebração. Por sua vez, o Conselho Mundial de Igrejas convidou as Igrejas
evangélicas, membros do Conselho para entrarem nessa mesma sintonia de cuidado
com o ambiente. E, nesses dias, algumas notícias da internet contam que grupos
hindus e budistas quiseram também unir-se a essa iniciativa ecumênica e
ecológica.
Orar e
meditar sobre a natureza como criação significa contemplar nela uma presença
ativa do Criador que, permanentemente, continua conduzindo o universo no rumo
do seu amor. O ser humano só mudará a sua forma de relacionar-se com os seus
semelhantes e com os outros seres vivos se optar por um olhar de amor sobre o
universo. Ao aprofundar a relação consigo mesmo e com os outros, é fundamental
pressentir uma marca divina por trás de cada ser do universo.
Atualmente,
o planeta Terra abriga mais de sete bilhões de pessoas. Nos próximos 50 anos, a
previsão é de que o mundo tenha entre 8, 5 a 9 bilhões de habitantes. Mas, como
viverá essa população, se metade dos recursos hídricos disponíveis para consumo
humano e 47% da área terrestre já são utilizados? E ainda assim mais de um
bilhão de pessoas passa fome e, a cada dia, mais de 30 mil morrem por este
motivo? Estudos afirmam que a relação
entre crescimento populacional e o uso de recursos do Planeta já ultrapassou em
20% a capacidade de reposição da biosfera e esse déficit aumenta cerca de 2,5%
cada ano. Isso quer dizer que a diversidade biológica – de onde vêm novos medicamentos,
novos alimentos e materiais para substituir os que se esgotam – está sendo
destruída muito mais rápido do que está sendo reposta. Esse desequilíbrio está
crescendo. Até 2030, 70% da biodiversidade poderá ter desaparecido...”[1].
Apesar de
tudo, uma profunda esperança brilha sobre a Terra. Ela vem do fato de que, no
mundo inteiro, a cada dia, cresce o número de pessoas e grupos que aprofundam a
espiritualidade e se põem em diálogo para buscar novos caminhos. O resgate da
dignidade da Terra, da Água e do Ar está na ordem do dia de grupos espirituais
das mais diversas tradições. As próprias Igrejas cristãs que, durante séculos,
pareciam não ligar o ato criador de Deus com sua atuação salvadora na história,
nas últimas décadas têm todas aprofundado essa questão. Em maio do ano passado,
o papa Francisco dirigiu a toda humanidade uma carta sobre o cuidado com a casa
comum. Nessa carta, ele se une a Bartolomeu, patriarca de Constantinopla, na
insistência em unir o cuidado ambiental com a preocupação pela justiça social e
econômica. Ao mesmo tempo, ensina que a raiz de tudo é um novo olhar espiritual
sobre o universo como criação amorosa de Deus.
Na América Latina, um dos mais importantes
sinais de esperança para a causa ecológica é o fortalecimento dos movimentos
indígenas. Esses têm proposto como novo paradigma civilizatório o cuidado com o
Bem-Viver que implica priorizar a vida comunitária, as relações humanas e a
relação harmoniosa com a natureza como formas de organizar a sociedade. O
cuidado com a Terra, a Água e todos os seres vivos se torna elemento central do
processo social e político, assim como de uma nova sensibilidade espiritual. Todos
nós somos convidados a participar ativamente dessa celebração de amor, como um
casamento entre o céu e a terra.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.
[1]
- INSTITUTO SOCIO-AMBIENTAL, Almanaque Sócio-ambiental Brasil 2008, São
Paulo, 2007, p. 33.
Nenhum comentário:
Postar um comentário