Por Marcelo Barros
Apesar de todos os
votos de "feliz ano novo", as perspectivas sociais, políticas e
econômicas para esse ano novo no Brasil e também para o mundo não são as
melhores. A palavra mais usada é crise. Nem mesmo os mais conservadores
conseguem esperar propostas de esperança vindas
dos governantes atuais do Brasil, dos Estados Unidos ou da Europa. No
entanto, celebramos o ano novo para nos reanimar na esperança.
Nesses dias, partiu
para Deus, o cardeal Paulo Evaristo Arns que consagrou toda a sua vida aos
direitos humanos. Ele atuou como bispo em tempos da ditadura brasileira e tinha
como lema: "De esperança em esperança".
Um dos filmes que
têm feito sucesso na Europa se chama "Amanhã". É um documentário
francês que conta a aventura de um casal que percorre vários continentes atrás
de experiências e testemunhos que deem esperança para a humanidade. O que
surpreende no filme é ver como, mesmo no momento atual tão complexo e no qual a
situação política não é fácil, por todo o mundo, se espalham experiências
sociais promissoras, crescem iniciativas de solidariedade e, por todos os
continentes, organizações de base assumem como perspectiva de vida o cuidado
uns com os outros, assim como a responsabilidade com a terra e a natureza.
Essa boa notícia faz
com que saibamos: é possível desejar uns para os outros e para toda a
humanidade os melhores votos de ano novo.
Para as culturas
antigas, a palavra é eficaz quando nasce no mais profundo do coração e é
precedida pela prática de vida. O Mahatma Gandhi ensinava: “Comece por você
mesmo a mudança que deseja para o mundo”. O Evangelho diz que a palavra de Deus
se realizou em João Batista no deserto (Lc 3). Isso significa que,
primeiramente João viveu a palavra e só depois a proclamou. Quando vivemos o
amor, a generosidade, a solidariedade e a partilha de vida, então, o nosso
desejo de que o mundo caminhe para isso se torna eficaz. Evidentemente que não
temos força para mudar organizações sociais e sistemas complexos e baseados em
leis estruturais. Não podemos pensar que somente pelo fato de desejar,
conseguiremos transformar o mundo. No entanto, podemos contribuir para que se
criem as condições necessárias para transformar estas leis e sistemas. O
importante é se comprometer em transformar esse bom desejo em um caminho
positivo concreto e efetivo para um futuro melhor tanto para nós como pessoas e
como membros da grande família da vida.
No Novo Testamento,
a 1ª carta de Pedro insiste que “nós temos a vocação da bênção, isto é, somos
chamados a bendizer, ou seja, invocar o bem sobre as pessoas e sobre o universo
(1 Pd 3, 9).
Você quer, de fato,
que este ano seja um tempo de profunda renovação da sua vida? Deseja que isso
repercuta bem para as pessoas ao seu redor e para todo o universo? Então,
refaça neste início de ano novo o compromisso de, a cada dia, consagrar um
tempo, por mínimo que seja, de gratuidade e interioridade para renovar um verdadeiro
e profundo diálogo consigo mesmo/a. Ao mesmo tempo, comprometa-se em ser, cada
vez mais, uma pessoa de diálogo com os outros, inclusive com as pessoas que
pensam e agem a partir de valores que você não aprova. O diálogo mais fecundo é
justamente com os que pensam e atuam diferentemente de nós. Além disso, procure
de todos os modos intensificar a comunhão solidária com a terra, a água e todos
os seres vivos do planeta. Faça isso e a bênção deste ano novo se realizará em
você e, a partir de você, no mundo. Você constatará, então, como se tornarão verdadeiras
e fecundas em sua vida, assim como para os que convivem com você, as palavras
da antiga bênção irlandesa: “O vento sopre leve em teus ombros. Que o sol
brilhe cálido sobre tua face, as chuvas caiam serenas onde moras. E até que, de
novo, eu te veja, que Deus te guarde na palma da sua mão”.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.
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