Por Marcelo
Barros
Atualmente,
procuramos ampliar a noção de direitos humanos incorporando a eles "os
direitos da Terra". Por isso, nesses dias em que celebramos a memória da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, a ONU propõe que seja comemorado um Dia Mundial
do Subsolo. O objetivo é tomarmos consciência de que nós e todos os seres vivos
dependemos do cuidado com o subsolo. Com todas as suas riquezas escondidas, o
subsolo deve ser cuidado e respeitado. Ele contém em si grande parte da
biodiversidade mundial e, portanto, requer a mesma atenção que a superfície da
Terra. Desempenha papel fundamental no fornecimento de água potável e na
possibilidade de resistir a secas e inundações. Do subsolo depende a qualidade
da nossa comida, a pureza da água, o equilíbrio do clima, a biodiversidade e a
vida. O maior depósito de carbono terrestre está no subsolo. Portanto, a sua
preservação pode contribuir para o equilíbrio climático.
Nas cidades, é comum dizer-se que saneamento e
o que está debaixo da terra não dão votos. No entanto, cada vez mais, as
empresas multinacionais se voltam para as riquezas escondias dentro da terra. Em
todos os países da América Latina, uma das mais graves causas da destruição ecológica
e da pobreza das populações locais é a exploração dos minérios e das jazidas
minerais que estão no subsolo. Desde os tempos da colonização, seja na
Cordilheira dos Andes, seja em Minas Gerais e mais recentemente na Amazônia, as
grandes empresas mineradoras têm provocado destruição da natureza, agravamento
das mudanças climáticas e muito sofrimento para os pobres. A mineração
representa o rosto perverso do modelo de desenvolvimento que ainda vigora em
grande parte do mundo.
Ban
Ki-moon, secretário-geral da Organização das Nações Unidas explica. "Temos
de garantir a gestão sustentável do subsolo, com base em uma administração
sustentável. Juntos, podemos cuidar que o subsolo continue a ser uma base
sólida e real para a vida".
Para a
maior parte das grandes tradições espirituais, o subsolo representa a
interioridade da Mãe Terra. Por isso, deve ser venerado como uma espécie de
útero de vida. Nas antigas culturas orientais, acreditava-se que, nos primeiros
meses de gravidez, o feto passava do ventre da mãe para o seio da Terra. Ali
era cuidado e fortalecido até que, pouco tempo antes do nascimento, retornava misteriosamente
ao útero materno. A própria Bíblia parece expressar essa crença no salmo:
"Tu, ó Deus, me acompanhavas, quando, misteriosamente, eu era gerado no
útero da terra". (Sl 139, 15). Pode ser por isso que, na Bíblia, é a
partir do coração da Terra que a Deus se eleva o grito das pessoas que sofrem.
Hoje, percebemos que a justiça social está intimamente ligada ao cuidado com o
subsolo. Assim como a Terra, o subsolo também não pode ser visto apenas como
mercadoria a ser vendida e produto comercial a ser explorado. Além disso, é
preciso sempre lembrarmos que as culturas tradicionais como as comunidades
indígenas e afro-brasileiras têm uma profunda relação de vida e de comunhão com
a Terra e todas as vezes que a relação com o subsolo é de exploração, essas
comunidades são oprimidas e prejudicadas.
Para os
cristãos, a festa de Natal celebra que, através da pessoa de Jesus Cristo, Deus
realiza um verdadeiro casamento com a humanidade e com o planeta Terra com
todas as suas riquezas naturais.
Celebrar o
Natal deve nos levar a um mais profundo reconhecimento de que a Terra e o seu
subsolo fornecem o material para o presépio de Deus e a sua presença no mundo
atual.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.
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