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terça-feira, 20 de dezembro de 2016

A BOA NOVA DO NATAL


Por Marcelo Barros



Na cultura da maioria das pessoas, Natal evoca presentes que recebemos e damos a parentes e amigos. Para outros, as festas do Natal significam aconchego familiar e dias de férias. Para as mães de família, Natal requer uma ceia especial com muitas comidas e bebidas. Fazer festa e reunir as pessoas queridas é sempre bom. Se o Natal serve para isso, tem uma boa função. No entanto, no mundo atual, se queremos ser mais justos com a Terra e a natureza, temos de rever o consumismo e organizar um modo de viver mais sóbrio e centrado em coisas mais essenciais. Se você quiser ir além da agitação que envolve esses dias, lembre-se que, no plano mais profundo, Natal significa renascimento.

Embora ninguém saiba a data exata do nascimento de Jesus, desde o século IV, os cristãos tomaram o 25 de dezembro, solstício do inverno no hemisfério norte, para celebrar a vinda de Jesus Cristo ao mundo, como o sol que ilumina e dá sentido novo a nossas vidas. Por celebrar o ciclo solar, o Natal é mais a celebração de um renascimento do que simples memória de um aniversário. Aliás, o que significaria nascer, se não fosse para estar abertos a um constante renascer? O poeta Pablo Neruda afirmava: “Nascemos como esboço. É preciso sempre renascer. Nascemos para renascer”.
De um modo ou de outro, todos os caminhos espirituais se propõem a ajudar as pessoas a viverem esse processo de transformação pessoal e comunitário. O Evangelho chama de metanoia, mudança de mente. O Budismo denomina de iluminação. Espiritualidades indígenas falam em despertar. Podemos dizer que renascemos cada vez que realizamos os passos que a vida exige e nos abrimos para uma nova etapa. Em cada idade física, o ser humano larga uma idade e renasce para outra. Em uma conversa com Nicodemos, Jesus explica: “O que nasce conforme o mundo (ou no modo de falar hebraico: o que nasce da carne) é carne, ou seja, pertence a esse modo de ser do mundo. O que nasce do Espírito, é espírito. Por isso, insisto, é preciso nascer de novo, nascer do Espírito” (Jo 3, 7).

O sentido mais profundo da celebração do Natal é abrir nossos corações e nossas vidas para essa perspectiva de uma vida nova, tanto no plano pessoal como de nossas relações e atividades sociais e até políticas. Viver o espírito do Natal é não apenas recordar Belém e o presépio no qual Jesus recém-nascido está rodeado de seus pais e é visitado pelos pobres pastores do campo. O espírito do Natal é a mística da inserção. Significa assumir a realidade em que vivemos e retomar nossas relações com as pessoas mais de base em uma linha de caminharmos juntos e de recomeçarmos o que nos anos 70 chamávamos "a Igreja que nasce do povo pela força do Espírito". Ao falar em Igreja, estamos voltando ao sentido original do termo. É a assembleia dos cidadãos e cidadãs do reino de Deus, cristãos ou não, gente de frequência eclesial ou não... A mística do Natal é o encontro com uma Política que se faz sagrada porque é libertadora e não tem vergonha nem medo de ser transformadora e até revolucionária. Como diziam os bispos latino-americanos na sua conferência em Medellín (1968): "Queremos construir uma Igreja libertadora de toda a humanidade e de cada ser humano por inteiro, em todas as suas dimensões" (Med. 5, 15).

O fato de que, no Natal, Jesus assumiu a condição humana com todas as suas fragilidades e problemas, faz com que as pessoas que creem sempre descubram razões para  esperar e  sempre, de novo, retomem a opção transformadora de um novo mundo possível. Essa opção exige uma profunda consciência crítica com relação ao modo de pensar da sociedade dominante e a decisão de manter, custe o que custar, nossa capacidade de amar, a disponibilidade ao diálogo e a sermos pessoas de coração terno e afável, sempre e cada vez mais humanos, como Jesus. 

Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países. 

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