Marcelo
Barros
Nessa
semana, a sociedade civil internacional retoma a reflexão sobre o cuidado com o
nosso planeta e como evitar as mudanças climáticas que tantos problemas têm
trazido ao mundo. Já há mais de 40 anos que a ONU assumiu o 22 de abril como
"o dia internacional da Mãe-Terra". Essa data não é iniciativa de
nenhum governo e sim resposta a uma
preocupação cada vez mais comum a toda a humanidade. Ainda mais em nossos
tempos conturbados, nos quais Donald Trump,
atual presidente dos Estados Unidos, declara que não se preocupa com
Ecologia. Para mostrar como concretiza esse pensamento, ele anulou todos os
tratados internacionais de cuidado com a natureza que o seu antecessor havia
assinado. Também decidiu refazer a indústria extrativa de carvão que tinha sido
paralisada pelos danos que provoca à terra e à natureza. Ao mesmo tempo, em
grande parte da África, milhões de pessoas estão sofrendo com a pior seca das
últimas décadas. Na República Democrática do Congo, para garantir a posse das
grandes minas de diamante, empresas estrangeiras armam grupos locais em
conflito. Africanos se matam uns aos outros em uma guerra civil que provoca
milhares de vítimas, principalmente na população civil e entre mulheres e
crianças.
O planeta
Terra está doente e, dessa vez, somos nós, humanos os principais responsáveis.
Esse modelo de desenvolvimento que a sociedade dominante continua impondo como
único possível se baseia na destruição implacável da natureza para gerar mais
lucro. No Brasil, desde o começo, governos e técnicos sabiam: a construção da
hidroelétrica de Belo Monte tem como preço pior a destruição da floresta, prejuízo
para o rio e para todo o bioma ali circundante. Além disso, as obras da
hidroelétrica provocaram a desestabilização de diversas comunidades indígenas e
dos ribeirinhos. Todas as estatísticas revelam que, na Amazônia, as queimadas e
a destruição da floresta chegaram à maior proporção que tinham alcançado desde
o começo dos anos 90. No Nordeste, em um rio São Francisco, com mais de sete
metros abaixo do seu nível normal e com todos os sinais de estar moribundo, o
governo continua o projeto da transposição. A publicidade é de que os canais feitos
a preço de ouro servirão às populações locais. No entanto, os principais
beneficiados serão as indústrias de agronegócio. Em Minas Gerais e no Espírito
Santo, os efeitos da destruição que a Samarco provocou em todo o vale do Rio
Doce não será revertido por várias décadas. Mais de quarenta outras mineradoras
estão em operação em nosso território. Usam os mesmos métodos e acarretam para
os rios e principalmente para as populações locais riscos semelhantes aos da
região de Mariana.
A criação
de postos de trabalho e benefícios a prazo curto levaram muitos governos
latino-americanos a acolherem em seus países empresas mineradoras e a reduzirem
ao mínimo necessário a legislação de proteção à natureza. Nas regiões mais
distantes, mineradoras saqueiam a terra e a natureza sem se preocupar
minimamente com os prejuízos ecológicos e humanos. Por isso, toda a sociedade
civil internacional comemorou como uma vitória o fato de que, na semana
passada, o governo de El Salvador assinou um decreto que proíbe a extração de
ouro e de outros minérios em todo o território nacional (Cf. Revista
Internazionale, 07/ 04/ 2017, p. 17). Quem sabe, essa vitória animará as
entidades ecológicas, os grupos indígenas e as populações locais a ampliarem as
lutas pacíficas que já existem e possamos, em breve, conseguir outras vitórias
para a mãe-Terra.
Durante a
Campanha da Fraternidade desse ano, a Igreja Católica no Brasil refletiu sobre
a importância do cuidado dos seis biomas nacionais, todos em situação de risco.
Nessa campanha, ficou claro que todos os cuidados com os biomas serão meramente
paliativos, se não mudarmos os critérios de civilização que norteiam o caminho
de nossas sociedades. É urgente assumir os paradigmas da sustentabilidade e do
Bem-Viver coletivo como objetivos principais e prioritários dos governos e da
sociedade civil. Esses critérios se baseiam não apenas em princípios
ideológicos e critérios técnicos, mesmo se esses são sempre importantes. São
propostas que se inserem nas tradições espirituais da humanidade e propõem uma
verdadeira espiritualidade ecológica. Essa forma de crer e de orar na relação
amorosa com a terra e o universo ultrapassa os limites das confissões
religiosas. Abre-se a todos os caminhos espirituais e culturas. Um documento
cristão do século II dizia: “Queres encontrar a Deus? Olha uma planta, ouve a
voz de um animal, ou mesmo quando contemplas uma pedra, poderás descobrir que ali está presente o
amor que te gerou”.
Marcelo
Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e
assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades
eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da
ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45
livros publicados no Brasil e em outros países.
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