Por Marcelo Barros
Ao verificar que os filmes de ficção
científica mostram um futuro sombrio e de "guerra nas estrelas", o
pensador Zigmunt Bauman via nisso um sinal de que no mundo atual a utopia de um
futuro melhor tinha se transformado em mera nostalgia de um passado idealizado.
A essa esperança projetada no passado e não no futuro, ele chamava de retrotopia.
Como se o futuro melhor para o mundo estivesse em uma volta ao passado. De tal
forma, os poderosos do mundo e a elite dominante comprometem o futuro da
sociedade que a esperança parece ser a volta a um passado que, apesar de tudo,
parece melhor.
Outro dia, ao comemorar seu aniversário, um amigo da geração dos
setenta afirmava: "Em muitos aspectos, o mundo dos meus pais era melhor do
que esse que passaremos à geração de nossos filhos". Para confirmar isso,
temos de concordar que guerra nuclear é pior do que a guerra artesanal anterior
à bomba atômica. As atuais regras de migração são mais desumanas do que as
anteriores. A realidade do desemprego estrutural, organizado para dar mais
lucro às empresas e provocado pela própria forma de organizar a economia é mais
desumana do que a sobrevivência dos pobres na sociedade industrial. E assim
podemos elencar diversos pontos e elementos nos quais o mundo em que vivemos é
menos comunitário e solidário do que o mundo de nossos avós. E estamos vivendo
no Brasil onde os poderosos de plantão se unem para destruir direitos
adquiridos pelos pobres, trabalhadores e índios na Constituição Cidadã de 1988.
Com a conivência do Judiciário e apoio dos grandes meios de comunicação,
governo e Congresso mudam a Constituição, sem nenhuma consulta ou referendo
popular. No mundo inteiro, parece se respirar um clima no qual o Capitalismo
neoliberal proclama que a Democracia é um rito formal a ser conservado na
medida do possível, mas já não é atual, nem necessária.
Ainda bem que, cada vez mais, a
sociedade civil internacional parece consciente de que temos de fazer alguma
coisa para o bem da maioria da humanidade e até para salvar o planeta Terra.
Esses homens e mulheres de boa vontade sabem que essa mudança de caminho não
pode ser uma volta ao passado, mas uma construção mais sustentável e cuidadosa
do futuro para nós e para a mãe Terra. As
pessoas que assumem uma Ética da dignidade humana e do Direito de todos querem
radicalizar mais e mais a Democracia. Sabem que, como diz a sabedoria da
Bíblia: "Aqueles que fazem carreira nem sempre são os mais capazes"
(Ecle 9, 11). De fato, quem observa com atenção os ambientes políticos sabe que
raramente quem está nos cargos públicos se preocupa com o bem comum. Por isso,
os movimentos sociais e comunidades de bairro se propõem a derrubar a pirâmide
social e, a partir de baixo, construir um poder que seja de todos. Trata-se de
um poder compreendido não como dominação, mas como possibilidade, capacidade de
libertar a todos/as. E não se pode esperar que quem toma as decisões pela
sociedade possa ou queira fazer isso.
Todo poder é excludente, mesmo quando é
eleito. Nos tempos da monarquia, parecia um sonho impossível imaginar que, um
dia, seria possível construir um poder através da eleição dos cidadãos e não
simplesmente ver o poder passar estupidamente do rei para o seu filho. Do mesmo
modo, precisamos crer e confiar na possibilidade de verdadeiramente construir
uma democracia participativa, mais comunitária e a partir dos mais pobres.
A Bíblia tem como centro a fé de que
Deus ordenou aos hebreus saírem da escravidão. Ele revelou que a vocação de
todo ser humano é ser livre e ter sua dignidade reconhecida. Nessa semana, lemos
nas Igrejas o texto do evangelho no qual Jesus se proclama o verdadeiro pastor
do povo que veio para que todos tenham vida e vida em abundância (Jo 10, 10). A
dimensão social libertadora é o eixo central da revelação bíblica e o coração
da espiritualidade judaico-cristã.
Ela expressa a relação com um Deus que é
amor e cujo projeto é a libertação de todos os humanos, o direito à vida de
todos os seres viventes e a comunhão do universo. Devemos lutar pacificamente
para sermos cidadãos e cidadãs desse mundo como testemunhas do reino de Deus
que, a cada dia, os cristãos oram no Pai Nosso para que venha e se estabeleça
entre nós.
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