Por Marcelo Barros
Na
preparação para celebrar o Natal, as Igrejas cristãs antigas leem belos textos
dos profetas bíblicos sobre a vinda do Messias e insistem em que as comunidades
devem intensificar a esperança na vinda do reinado divino nesse mundo. É
urgente testemunhar essa realidade nova.
A realidade
atual do nosso país e do mundo nos dá poucos motivos para manter a esperança de
um futuro melhor. A cada dia, a sociedade dominante se faz mais desigual e
indiferente ao sofrimento dos mais pobres. A cada ano, os países aumentam os
seus gastos com armamentos. Para vendê-los, os impérios sustentam 16 conflitos
armados na África e alguns outros no Oriente Médio. No momento atual, 15 mil bombas nucleares
estão armadas em oito países do mundo. Cada uma delas tem um poder cem vezes mais destrutivo do que as
bombas que, em 1945, destruíram Hiroshima e Nagazaki.
Os impérios
pregam que o pior flagelo que ameaça a humanidade é o terrorismo. De fato, essa
campanha para provocar medo tem como finalidade justificar a repressão e um
terrorismo de Estado pior do que a ação dos fanáticos que praticam atentados e
matam inocentes. Na realidade, o que, atualmente, mais ameaça a humanidade não
é o terrorismo e sim as mudanças climáticas provocadas pela ambição humana que
produz pobreza, provoca a fome e destrói a natureza.
Esse modo
de organizar o mundo só produz desigualdade social, desemprego, fome,
sofrimento do povo e destruição da natureza. Os poderosos do mundo não aceitam
mudar esse modelo civilizatório, mas a própria Terra grita: se a humanidade
prossegue nesse caminho, o próprio sistema de vida se tornará inviável no
planeta.
Em todos os
continentes, movimentos sociais e estudiosos revelam: não é verdade que seja esse
o único modo possível de organizar o mundo. Na Europa, grupos altermundialistas
aprofundam estilos de vida baseados na sobriedade e contra o consumismo. Na
América Latina, povos indígenas propõem como paradigma o bem-viver como objetivo das sociedades, projetos de governos e
caminho de espiritualidade humana.
Todas as
religiões anunciam a paz e pedem amor. No entanto, até agora, não chegam a contestar
as estruturas de ódio e violência que organizam o mundo dessa forma perversa. O
papa Francisco parece ser o único líder mundial que chama a atenção para a
urgência de transformar essa realidade. Já por três vezes, reuniu junto a si
centenas de representantes de movimentos sociais de todo o mundo para
escutá-los e para confirmá-los em suas lutas pacíficas por um mundo mais justo.
A eles, o papa disse claramente: "esse
sistema que domina o mundo é, por natureza, cruel e assassino". Na
carta sobre o cuidado com a Terra, nossa casa comum, ele pede claramente uma aliança de toda a humanidade, uma
iniciativa de pessoas e grupos de todas as religiões e culturas, em favor da
Terra, da Vida no planeta e da justiça eco-social.
Em uma
sociedade que planeja a competição e favorece o individualismo, esse projeto de
união de todos parece uma utopia distante e, concretamente, muito difícil de ser
realizada. No entanto, como, a cada dia, tem revelado o papa através de gestos
concretos, esse é um trabalho a ser construído pouco a pouco e a partir das
bases. No caso dos cristãos, é a forma de atualizarmos a palavra de um profeta,
discípulo de Isaías:
"Voz do que grita no deserto: Preparai o
caminho do Senhor, traçai no deserto uma estrada para Deus passar. Todo o vale
será elevado e todo o monte e colina serão rebaixados. O que é torto se
endireitará e o que é áspero se aplainará. (Todas as desigualdades serão
eliminadas). A presença (glória) de Deus se manifestará e todas as criaturas a verão,
pois o Senhor assim o prometeu" (Is 40, 3 - 5).
Marcelo Barros, monge beneditino e escritor, autor de 26 livros dos quais o mais recente é "O Espírito vem pelas Águas", Ed. Rede-Loyola, 2003. Email: mostecum@cultura.com.br
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