Por Marcelo Barros
O dia dos pais
que, no Brasil, foi celebrado nesse domingo nos faz pensar que, apesar dos
apelos comerciais desse tipo de comemoração, é sempre bom que haja ocasião como
essa na qual os filhos expressam seu amor pelos pais e esses podem pensar em
como ser pai em uma sociedade que, a cada dia, passa por profundas
transformações.
Estudos
arqueológicos e pesquisas antropológicas, feitas no Oriente Médio, na Turquia, na
ilha de Creta e na China, nos revelam: há 8 mil anos, a maioria das antigas civilizações
antigas se organizava de forma matrilinear. A referência da sociedade era a
família da mãe. Nessa forma de organização, homens e mulheres conviviam em
situação de maior igualdade e a propriedade da terra era comunitária. Havia
certa igualdade sexual e as sociedades eram mais pacificas e não conheciam a
guerra.
Há cinco mil
anos, mais ou menos, no Oriente Médio e na atual Europa, as sociedades
começaram a se organizar a partir da agricultura. Então, os homens passaram a
ser chefes da família e as sociedades se tornaram patriarcais. A partir daí, a história
da humanidade passou a ser uma sucessão de guerras e conquistas. Conforme essas
pesquisas, foram as sociedades patriarcais que geraram as diferenças de classes
sociais e inventaram a escravidão, primeiramente dos inimigos conquistados nas
guerras e depois de pobres endividados, escravizados para pagar dívidas. (Cf. Walter Link, Engaging the
Power, Discernment and Resistance in a World of Domination, Fortress Press,
Minneapolis, 1992).
Infelizmente,
até hoje, o assunto é atual. As raízes culturais do patriarcalismo são as
mesmas. Em tal realidade sócio-política, as famílias não podem respirar clima
de diálogo. O modelo patriarcal não funciona mais. Por outro lado, não se encontrou
ainda outro estilo de relações familiares. Mães e filhos se desgastam na luta
pela sobrevivência e, na maioria das vezes, os homens resolvem o problema pela
ausência ou por cumprir meras obrigações econômicas.
Todos sabem
que não basta ser pai biológico. Hoje, até as provetas de laboratório garantem
isso, sem necessidade de presença humana. O importante e desafiador é ser pai
na cotidianidade da construção de uma relação de diálogo familiar, na qual os
filhos que crescem precisam de referências de diálogo e apoio afetivo. Não
deixa de ser sintomático saber que, no Brasil, a média de duração dos
casamentos é de dez anos. Na maioria dos casos, o que sobrevive é uma família
nuclear, constituída por mãe e filhos, onde, quase sempre, falta a presença
masculina positiva e não dominadora. É claro que, neste modelo, a mulher também
tem muita responsabilidade até porque muitas vezes, se apodera dos filhos de
forma que não sabe delegar nem repartir responsabilidades. Apesar de sofrer e
se queixar, nada faz de positivo na mudança do modelo de pai que o homem tem e
pode oferecer.
As
comemorações do dia dos pais nos recorda e confirma: o mundo precisa de um novo
jeito de ser pai. A função paterna é necessária para o equilíbrio da família,
para uma relação mais justa com a mulher, para a saúde psíquica e emocional dos
filhos e para a organização de uma sociedade mais paritária e pacífica.
Apesar de que
não existem escolas para isso, os movimentos sociais e organizações populares
têm sido palcos de discussão deste assunto. Têm conseguido transformar homens e
mulheres, formados na cultura patriarcal em protagonistas que ensaiam novas
relações familiares e sociais. Novas formas de viver a paternidade não serão
descobertas sem a participação das mulheres e de uma relação de gênero tecida
na cumplicidade e no diálogo criativo entre todos e todas. Ser pai e mãe em uma
forma não patriarcal nem de dominação só podem ser ensaiadas no engajamento
pela justiça, no trabalho de criação artística e no compromisso com o futuro do
planeta. Pais e mães precisam sempre retomar o apelo dramático do poeta Carlos
Drummond de Andrade:
“Além da Terra, além do Céu/ no trampolim do
sem-fim das estrelas, / no rastro dos astros,/ na magnólia das nebulosas,/
Além, muito além do sistema solar, / até onde alcançam o pensamento e o
coração, / vamos!/ Vamos conjugar/ o verbo fundamental essencial,/ o verbo
transcendente, acima das gramáticas, e do medo e da moeda e da política, / o
verbo sempreamar, / o verbo pluriamar, /
razão de ser e de viver”.
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