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quarta-feira, 6 de setembro de 2017

EVANGELHO E DIREITO CANÔNICO NÃO COMBINAM MESMO



por Juracy Andrade

Veio ao nosso país para lançar um livro o cardeal Raymond Burke. Esse purpurado é um dos principais críticos do papa Francisco. Sente saudade de uma Igreja imperial, monárquica. “Um barco sem timoneiro” é como ele descreve a Igreja Romana no atual papado. Quer que a liturgia da missa volte a ser em língua latina e reprova o acolhimento de divorciados recasados e de gays. Enfim, um cardeal rebelde e disposto a enfrentar as mudanças que o papa vem fazendo.

É estadunidense e patrono da Ordem Soberana e Militar de Malta, um resquício das Cruzadas, e formada hoje por leigos de famílias nobres dedicados a trabalhos humanitários. O grão-mestre da ordem era Matthew Festing, que se envolveu em divergências com Francisco, o qual lhe impôs a renúncia. O papa nomeou para a ordem um delegado seu, o que poda os poderes do grão-mestre e do grão-chanceler da ordem e os do seu patrono, que é o cardeal descontente Burke.

Há alguns dias, os muros de alguns bairros próximos ao Vaticano amanheceram cobertos com cartazes de críticas a Francisco e a seu desejo de renovação e volta da Igreja a práticas evangélicas. “A missão dos cristãos na sociedade é dar sabor à vida com a fé e o amor que Cristo nos deu e, ao mesmo tempo, afastar os germes que contaminam de egoísmo, inveja e difamação” é uma frase do papa em mensagem dominical aos fieis na Praça de São Pedro.

Burke foi avisado pelo papa que será afastado do Tribunal da Assinatura Apostólica do Vaticano, onde está desde 2008. Trata-se de um dos membros mais conservadores do clero americano, que interpreta rigidamente a doutrina católica. No Sínodo Extraordinário dos Bispos sobre a Família, o cardeal exerceu, com outros, um bloqueio das minorias contra aberturas em relação a homossexuais e divorciados.

Burke estudou teologia na Universidade Gregoriana de Roma, onde chegou ao doutorado em direito canônico. É importante assinalar essa sua dedicação ao direito canônico. Os juristas canônicos têm geralmente uma tendência de dar mais valor ao direito que ao Evangelho. Tivemos, aqui na Arquidiocese de Olinda e Recife, o arcebispo dom José Cardoso, que, antes de vir para cá substituir dom Helder, dava aulas de direito canônico em Roma. A administração dele foi catastrófica do ponto de vista evangélico. Desmontou todos aos avanços introduzidos após o Concílio e chegou a excomungar uma garotinha estuprada pelo padrasto que fez aborto.

Evangelho e direito canônico não combinam mesmo.



O autor é jornalista com formação em filosofia e teologia

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