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terça-feira, 26 de setembro de 2017

FRÁGEIS CRISTAIS DE UM TEMPO PASSAGEIRO


Por Marcelo Barros

Ao consagrar o 1º de outubro como “dia internacional das pessoas idosas”, a ONU quis responder a dois desafios. O primeiro é o envelhecimento da população. Atualmente, na maioria dos continentes, diminui a taxa de nascimentos. Ao mesmo tempo, a medicina prolonga a média de vida das pessoas. A ONU considera alguém idoso se a pessoa tiver mais de 65 anos ou, em países mais empobrecidos, ao menos 60. Segundo os organismos internacionais, até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas. Cada vez é mais frequente conhecermos homens e mulheres na faixa de cem anos. Não parece mais atual a palavra do salmo que afirmava: “Setenta anos é a duração de nossas vidas. 
Oitenta, se somos fortes” (Sl 90).   Aí se junta o segundo desafio: Ao contrário das culturas antigas que veneram os idosos, a sociedade capitalista só valoriza quem está na idade de produzir e comprar. Frequentemente, os mais velhos se sentem marginalizados e condenados a se tornarem cada vez mais dependentes. Por isso, ao instituir o dia das pessoas idosas, a ONU propõe como direito de todos os idosos, acesso aos cuidados de saúde, possibilidades reais de integração social e direito às informações e à educação permanente.

Todos nós, mais velhos ou mais jovens, somos como cristais belos, mas frágeis. Um pequeno descuido ou um passo em falso e tudo pode acabar. Não bastasse isso e, como diz Zigmunt Bauman, a própria sociedade parece se liquidificar. As relações sociais se tornam fluidas, laços familiares facilmente se desfazem e a  própria vida se revela precária.

Ninguém gosta de envelhecer. Propagandas sobre a “melhor idade” só atingem quem não sabe o que significa sentir, de repente, ou aos poucos, o corpo cada vez mais frágil e enrugado. Ninguém gosta de ver suas forças físicas, a memória e a agilidade mental diminuírem. Só mesmo uma profunda estabilidade interior pode dar equilíbrio e garantir a paz.

Nas culturas afrodescendentes e indígenas, as pessoas mais velhas são vistas como portadoras da sabedoria do Espírito. De acordo com a Bíblia, a aliança de Deus com os pequenos e marginalizados do mundo começou com Abraão. Com mais de 80 anos, ele era patriarca de um clã de lavradores sem-terra. Escutou uma palavra divina para sair de si mesmo, de sua cultura, do seu ambiente clânico e partir. Assim, ele iniciou uma caminhada em busca de uma terra livre e de uma descendência numerosa. Abraão era casado com Sara, mulher velha e estéril. Deus tornou a sua velhice abençoada e seu casamento fecundo. Ao comentar esses textos antigos, o apóstolo Paulo escreve que, assim como Deus fez nascer uma vida nova do corpo já amortecido de Abraão, Ele ressuscita Jesus e dá a todos nós que cremos, uma vida nova (Rm 4, 19- 22).

Conforme o evangelho de Lucas, quando os pais levaram Jesus, recém-nascido para, conforme a lei judaica, apresentá-lo no templo, ele foi acolhido por Simeão e Ana, dois anciãos, profetas que souberam reconhecer quem era aquela criança. Através daquele menino, eles anunciaram uma nova esperança de libertação para o povo de Israel e para toda a humanidade (Cf. Lc 2, 25 ss). Também hoje, pelas condições especiais de sua idade, as pessoas idosas são portadoras de um apelo de mais humanidade para todos.


    Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países 

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