Por Marcelo
Barros
No Brasil,
queremos retomar um clima de diálogo que nos permita conviver com as diferenças
e, ao mesmo tempo, não permitir que os direitos dos trabalhadores e a cidadania
dos mais pobres sejam desrespeitados e destruídos. A realidade difícil que
vivemos nos recorda Dom Helder Camara, pastor da Igreja e profeta da justiça
que, nessa terça-feira, 07 de fevereiro, comemoraria o seu aniversário de
nascimento. No Recife, na noite dessa terça-feira, uma vigília das pastorais
sociais lembrará essa data importante.
Atualmente,
Dom Helder Camara é nome de um Fórum social e político constituído por
representantes de movimentos sociais. Por todo o Brasil, é também nome de assentamentos de lavradores sem-terra.
O seu nome também está no Centro de reflexões sobre Fé e Política da CNBB e em
muitas outras iniciativas, todas visando justiça e libertação do povo.
Dom Helder
exerceu o seu ministério de arcebispo em Olinda e Recife nos tempos difíceis de
uma cruel ditadura militar e teve dificuldade de ser compreendido tanto pela
sociedade dominante, quanto por muitos irmãos da própria Igreja. Do seu exemplo
e de suas palavras, podemos extrair algumas lições que nos ajudam a enfrentar
os tempos difíceis em que vivemos. Dom Helder nos ensinava que quanto mais
escura é a noite, mais luminosa pode ser a madrugada que anuncia o novo dia.
Isso o fazia nunca desanimar diante das dificuldades que enfrentava tanto no
nível social e político, como nas relações eclesiais. Ele acreditava que, como
anunciava o profeta bíblico: "o deserto se transformará em jardim". Mesmo
aquilo que, no mundo e ao redor de nós, parece uma situação impossível de ser
transformada pode sim ser superada, através do pensamento crítico e da prática
organizada do trabalho de base.
Dom Hélder
dizia: “Nenhuma felicidade pode basear-se na infelicidade dos outros, porque
ofenderia o sentido de justiça que diz respeito a todos (...) Deus deu ao ser
humano o poder e a responsabilidade de não se conformar com o sofrimento do
inocente, mas de combater o mal e a injustiça. Esta é a tarefa de todos nós”[1].
O mundo
não mudará pela ação isolada de líderes esclarecidos e sim pelo empenho
comunitário de grupos de resistência e de profecia que se consagrem a
transformar o mundo a partir de uma profunda convicção de fé no ser humano e na
vida. Dom Hélder chamava esses grupos de minorias abraâmicas, por serem
fecundos fermentos de uma humanidade nova. Mesmo se, na luta, somos como Davi, jovem
e frágil, em combate contra Golias, o poderoso gigante, a fé nos faz acreditar
que temos do nosso lado o Espírito Divino. Ele nos impulsiona de de luta em
luta, sempre no testemunho de um projeto divino que nasce dos pequenos, desses
grupos de base, aparentemente impotentes que Dom Helder chamava de
"abraâmicos" porque tornam fecundo o impossível chão de nossas
esperanças.
É
preciso nos sentir convocados/as de novo para esse mutirão de esperança e
solidariedade tão urgente no mundo. Em 1994, Dom Hélder mandava esta mensagem
ao movimento italiano Mani Tesi (Mãos Estendidas): “…não estamos sós.
Por isso, não aceito nunca a resignação nem o desespero. Um dia, a fome será
vencida e haverá paz para todos. A
última palavra neste mundo não pode ser a morte mas a vida! Nunca mais pode ser
o ódio, mas o amor! Precisamos fazer com que não haja mais desespero e sim
esperança. Nunca mais vençam as mãos enrijecidas contra o outro e sim o que o
movimento de vocês valoriza: Mãos estendidas! Unidas na solidariedade e no amor
para com todos”.
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.
[1]
- HÉLDER CÂMARA,
Interrogativi per vivere, Cittadella 1984
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