Por Marcelo Barros
Alguém que
viesse de outro planeta poderia se espantar com o povo brasileiro. Em meio a
todos os problemas sociais e políticos do país, em várias regiões, o povo se
entrega às alegrias das festas juninas.
Evidentemente,
as festas populares podem ser expressões de mera alienação social e política. Através
delas, as pessoas esquecem, ao menos por instantes, as lutas cotidianas da
vida. No entanto, podem também servir de ensaio para uma mais eficiente
organização popular. Assim, revelam uma resistência cultural que os meios de
comunicação não conseguem vencer.
Na Bolívia,
Peru e Equador, na noite do 24 de junho ou nos dias próximos, os índios
festejam o Inti-Rami, festa do Sol, celebração principal do ano novo andino. É o
correspondente aos festejos juninos do Brasil. Algumas dessas danças tiveram
sua origem em cortes da Europa. Hoje, as pessoas se vestem como gente da roça, mas
executam danças da nobreza de outros séculos. Em brincadeiras como casamentos
caipiras, figuras como padres e juízes da roça são caricaturadas, porque só se
interessam por dinheiro e poder.
Essas críticas revelam o modo como as camadas
mais empobrecidas do povo podem expressar sua crítica e seu protesto social. Até
os santos são envolvidos no clima de festa. Santo Antônio é considerado santo
casamenteiro. São João Batista é uma criança que vem brincar nas fogueiras do
povo e São Pedro se torna companheiro de festas. O povo liga os santos às
realidades da vida cotidiana.
O caráter
lúdico da crítica popular, latente nas brincadeiras juninas pode ser ensaio de
uma sociedade nova na qual todos são protagonistas. Assim, na alegria e de
forma despretensiosa, grupos e comunidades populares sinalizam uma realidade
nova que se aproxima ao que os evangelhos chamam de reinado de Deus. Do seu
modo e em sua expressão laical, essas festas trazem alegria e criam certa
unidade nas comunidades. Parecem cumprir a palavra do mensageiro de Deus no
evangelho que, ao anunciar o nascimento do profeta João Batista, prometeu:
"Por seu nascimento, muitos se alegrarão" (Lc 1, 14). Ao criticar a
sociedade dominante e expressar uma palavra dos pobres, as festas juninas
expressam a verdade que os evangelhos atribuem a São João Batista: “Mudem de
vida porque a realização do projeto de Deus no mundo está próximo!” (Mt 3, 2).
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.
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