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terça-feira, 24 de outubro de 2017

PARA UM FÓRUM PERMANENTE DOS POVOS



Por Marcelo Barros

Nessa semana, o mundo recorda o 24 de outubro de 1945, quando foi proclamada a Carta das Nações Unidas e fundada a ONU. Agora, 72 anos depois, boa parte da humanidade percebe que continua necessária uma organização internacional que regule as relações entre os Estados. Apesar de fragilizada e ter o seu Conselho de Segurança dominado pelas grandes potências e a serviço de suas causas, a ONU ainda reúne os governantes em função da paz e do bem de toda a humanidade. No entanto, cada vez fica mais clara a urgência de se constituir um organismo com perfil semelhante que reúna cidadãos da sociedade civil. A paz, a justiça entre os povos e o cuidado que a humanidade deve ter com a Terra são questões por demais importantes para serem deixadas apenas aos cuidados de técnicos e governantes. Um princípio jurídico dos tempos antigos afirmava: "Aquilo que diz respeito a todos deve ser tratado e decidido por todos".

Nessa direção, nas últimas décadas, foram tentadas várias tentativas. Em junho de 1992, no Rio de Janeiro, enquanto os chefes das nações faziam a Rio 92, os movimentos e organizações sociais se reuniam no Aterro do Flamengo. Foi um encontro de cidadãos/ãs do mundo inteiro. O plenário dessa movimentação se chamava "Cúpula dos Povos". A partir do levante dos índios do Sul do México (1994), em Chiapas aconteceram três encontros que se chamaram: "Encontros da humanidade pela Vida e contra o neoliberalismo". Ao mesmo tempo, na Itália e na França, grupos tentavam organizar uma "ONU dos povos". Em 2001 começou o processo dos fóruns sociais mundiais. Quase vinte anos depois, esse processo continua vivo e interpelador. O próximo Fórum Mundial ocorrerá em Salvador, BA, de 13 a 17 de março de 2018.

Esses eventos são oportunos e úteis. No entanto, precisamos de uma articulação que vá além das manifestações ocasionais para algo permanente e cotidiano. No Brasil atual, dezenas de movimentos e organizações sociais se juntam em coletivos como a "Frente Brasil Popular" e ainda a "Frente Povo sem Medo".

Dos povos andinos, se espalha pelo continente a proposta de que o Estado e todas as organizações sociais, políticas e econômicas devem tomar como prioridade o paradigma que os índios chamam: o Bem Viver. Corresponde ao que, no evangelho, Jesus propõe como "vida em plenitude", ou vida de qualidade (Cf. Jo 10, 10).

No Oriente Médio, alguns povos como os armênios e os curdos vivem sem direito a se sentirem plenos cidadãos da terra em que nasceram. São considerados como estrangeiros em seus próprios países de origem: a Turquia, a Síria e o Iraque. Abdulah Ocalan, líder dos curdos, atualmente está em uma prisão da Turquia e foi condenado à morte. Ele propõe como novo caminho político o Confederalismo Democrático. Trata-se de uma administração política não estatal. É uma democracia sem Estado. Ao constatar que os Estados se fundamentam sob o poder das armas e da coerção, ele propõe um caminho democrático que busque no diálogo o consenso coletivo que seja possível, a convivência com a diversidade étnica, cultural e religiosa. Esse caminho, diferente e até contrário ao caminho trilhado pela sociedade dominante só é possível a partir de uma forte educação comunitária, uma profunda fé na dignidade humana e na capacidade de juntos desenvolvermos as sementes de bondade que existem em cada ser humano.

É impressionante que esse tipo de proposta venha de um líder social e não de ministros religiosos. Esses, em geral continuam a pensar o seu ministério e as relações entre pessoas, mesmo em uma comunidade religiosa, como relação vertical de mando e obediência. Para os cristãos, é importante recordar que, segundo o evangelho, na hora da última ceia, ao despedir-se do seu grupo de discípulos e discípulas, Jesus lhes disse: "Os reis e governantes dominam sobre os povos. Os que têm poder querem ser chamados de benfeitores. Entre vocês, não deve ser assim. Quem quiser ser o maior se torne o menor e quem se propõe a governar seja como quem se coloca a serviço dos outros" (Lc 22, 25- 26).  


 Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países    

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