Por Marcelo
Barros
Nessa 2a
feira, 13 de março, completam-se quatro anos da eleição do papa Francisco. Nesses
dias, por duas vezes, Roma amanheceu com a polícia recolhendo cartazes,
espalhados por toda a cidade. Esses cartazes traziam a foto do papa com
expressão carrancuda. Os cartazes diziam que ele é um homem indeciso e ensina
erros e heresias. Em Roma, esse tipo de manifestação pública contra um papa
nunca tinha ocorrido. E o mais inusitado é que não parte de grupos ateus ou
adversários da Igreja, mas, ao contrário, vem de católicos que pensam agir em
nome da fé.
Desde que,
em 2013, o papa Francisco assumiu o ministério de bispo de Roma, ele formulou
seu projeto de uma "Igreja em saída". E na exortação "A alegria do Evangelho",
deixa claro que prefere "uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter
saído pelas estradas a uma Igreja enferma por fechamento" (EG 20- 24).
Esse projeto conquistou a simpatia e o entusiasmo de muita gente, dentro e fora
da Igreja Católica. No entanto, há fortes sinais de resistência e de desagrado
na Cúria Romana, no meio dos bispos, do clero e de alguns movimentos
internacionais de leigos. Esses optam por uma Igreja autocentrada. Querem restaurar
ou recompor em novo estilo a antiga Cristandade, quando a Igreja Católica tinha
prestígio e poder na sociedade. Com nuances diferentes, os dois últimos papas
anteriores a Francisco propunham claramente esse modelo de Igreja, centrada no
poder clerical, na severidade da lei moral e em um pacto de boa convivência com
os poderosos do mundo. Grande parte do atual clero e de muitos bispos em
exercício nas dioceses foi formada nessa orientação.
Os grupos que
se declaram contrários ao papa Francisco são uma pequena minoria entre os
católicos. Chefiados por um cardeal norte-americano e outro italiano, mais
alguns cardeais e bispos ligados à Cúria Romana, enfrentam diretamente o papa e
denunciam que ele está errado ao abrir a possibilidade de dar a comunhão a
divorciados. Enquanto isso, uma grande maioria do clero e dos bispos mantém-se
em silêncio, como à espera de que esse papa se vá e tudo volte ao normal.
Finalmente, há ainda muitos fieis, padres e bispos que simpatizam com o papa,
dizem estar do lado dele, mas não parecem compreender exatamente aonde o seu
projeto pode levar a Igreja. São a favor do papa porque ele é o papa e não
porque ele está propondo reconduzir a Igreja ao evangelho de Jesus. Recentemente
uma revista semanal fez um levantamento em algumas capitais brasileiras. O
interesse era saber até que ponto a proposta do papa Francisco tem conseguido
mudar alguma coisa no modo de ser e de viver a missão nas dioceses e paróquias do
Brasil. A equipe encarregada da pesquisa procurou saber como atualmente se
fazem as pregações, as celebrações da fé e como é a relação entre o clero
católico e os movimentos sociais. A revista não encontrou mudança significativa
em nenhuma das nossas dioceses e arquidioceses. Parece que, até aqui, a
proposta do papa Francisco não parece ter modificado em nada o jeito de ser das
paróquias e dioceses, paróquias e conventos.
De fato,
ninguém se mostra contrário ao fato do papa Francisco ir a ilha de Lampedusa
encontrar os migrantes e refugiados clandestinos e propor ao mundo a
solidariedade. Também não se dizem contrários ao papa já ter encontrado por
três vezes representantes de movimentos sociais de todo o mundo. Mas não ligam
essas questões sociais com a fé. Muitos passam a usar a linguagem dos discursos
do papa. Falam em "Igreja em saída", em misericórdia e em discípulos
missionários de Cristo, mas não veem além de uma Igreja autorreferencial e
clerical.
Alguns dos
cardeais que atualmente lideram um movimento contra o papa se unem ao novo
presidente dos Estados Unidos. O papa não responde diretamente, mas propõe uma
união das Igrejas e religiões para denunciar a economia assassina do
Capitalismo, responsável por mais de um bilhão de pessoas passando fome no
mundo.
Em Roma, um
dos secretários do papa, entrevistado por uma revista alemã, criticou o papa
por presidir uma celebração importante na Basílica do Vaticano, vestido como
"pároco do interior lá do país dele". O secretário expressou essa
crítica e concluiu com a seguinte pergunta: - Nesse caminho, até onde ele vai
chegar?
Poucos
dias, depois, ao entrar no escritório do papa, vê que ele tem na mesa a tal revista
e está lendo a entrevista que o secretário havia concedido. O bispo pede
desculpas ao papa e esse lhe responde:
- "Fique
tranquilo. Você tem toda liberdade de dizer o que pensa. Eu só gostaria de
responder à sua pergunta: Até onde eu quero ir? Se vocês me permitirem, ao
evangelho de Jesus".
Marcelo Barros, monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares. É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.
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