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quarta-feira, 5 de julho de 2017

A GRAÇA DA CASTIDADE E A IMPOSIÇÃO DO CELIBATO PELO DIREITO CANÔNICO

Por Juracy Andrade



Nos primeiros dez séculos da Igreja, os padres e bispos não eram obrigados a se abster do casamento. Lembro isso ao eclodir mais um escândalo de pedofilia, de que é acusado o cardeal australiano George Pell, atualmente tesoureiro do Vaticano. Ele nega veementemente a acusação e vai comparecer à polícia em sua terra. Disse que o papa Francisco lhe concedeu licença para defender-se. A obrigação jurídica do celibato sem a graça, o carisma, da castidade é uma aberração.

O horror ao sexo que tomou conta do cristianismo, fazendo com que Tomás de Aquino, mesmo antes de se tornar monge, pegasse um tição a saísse correndo atrás de uma mocinha que se ofereceu a ele, tomou desvios estranhos.

 Aparentemente, boa parte do clero diocesano e religiosos concluiu que o sexo só seria pecado entre homem e mulher, o que abre caminho a uma ampla prática da pedofilia. Tal prática acentuou-se aqui no nosso país desde que o Concílio de Trento (Contrarreforma) implantou-se por estas bandas. Antes, padres e frades eram verdadeiros patriarcas, com suas amásias que chamavam de comadres para evitar falatório. Com o tempo, liberaram geral e conventos foram se despovoando, o que levou a uma restauração sobretudo das ordens beneditina e franciscana, através de monges mais disciplinados importados da Alemanha. Essa história de São Tomás lembra O nome da rosa, de Umberto Eco, com aquela passagem da pobre camponesa em busca de comida e aproveitando para traçar um noviço (com os monges mais velhos a comilança era generalizada).

Ainda hoje, sabemos, o celibato não é exigido em muitas igrejas orientais. Em algumas, o padre tem de casar antes da ordenação e não pode chegar a bispo. 

Houve tentativas de exigir o celibato em concílios como os de Elvira e Niceia (século 4º). Mas a exigência só foi oficializada, pelo papa Gregório 7º, em 1073. Ele foi longe, considerando herético o matrimônio de sacerdotes porque isso os distrairia do serviço de Deus e contrariava o exemplo de Jesus Cristo. Mas há outra interpretação para essa proibição, segundo vários historiadores: era um meio de evitar que as heranças de sacerdotes e bispos fossem para as mãos de seus filhos e viúvas, em vez de ir para a posse da Igreja. Anos mais tarde, o 1º Concílio de Latrão decretou a invalidade do casamento de clérigos, que foi reforçada pelo 2º Concílio de Latrão.

Deseja uma grande quantidade de cristãos católicos que o papa Francisco, com sua nova visão dos problemas que afetam a Igreja, encaminhe providências para uma revisão, talvez lenta devido aos conservadores, da legislação canônica sobre o celibato clerical. As crianças abusadas sexualmente agradecem. E o carisma da castidade será preservado, sem direito canônico.



O autor é jornalista com formação em filosofia e teologia

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