admiração, reconhecimento, uma indagação e uma crítica
PRIMEIRA PARTE
No filme Dias de
Nietzsche em Turim, há um momento em que ele, dionisionicamente, nu, com
máscaras, este homem, já flertando com a loucura, dança, dança e dança. Em seu
livro A Gaia Ciência § 54, ele escreve:
“... danço minha dança ... a dança
terrestre ... festiva da existência”.
A filosofia em Nietzsche seria toda plural e múltipla? Os temas centrais serão sinópticos? A compreensão trágica da vida, a vontade de potência, o eterno retorno e o conceito de além-do-homem ( Ubermensch) são vistos todos nessa única perspectiva plural?
Nietzsche valoriza a
existência de posições contraditórias no homem como algo positivo, como uma
condição mesma para seu futuro desenvolvimento.
O PENSAMENTO TRÁGIGO de Nietzsche
exclui a possibilidade de uma unidade final. A vida é múltipla e pluralista:
prazer e dor, vida e morte. A compreensão trágica pode ser definida como a
alegria do múltiplo, a alegria do plural. No canto ébrio de Assim
falou Zaratustra ele
escreve:“Nunca disseste sim a uma alegria? Ah, meus amigos, então já disseram sim a uma
dor? Todas as coisas estão encadeadas, emaranhadas, ligadas pelo amor?”
A compreensão trágica da
vida contém também um desafio ético: ela nos convida a permanentemente simbolizar , a destruir máscaras e a
criá-las, consciente do seu caráter de máscaras. Essa concepção afirma a necessidade de aceitar o desafio de
articular, em palavra e atos, aquilo que não é completamente articulável,
propõe o fim de todo fundamento fixo. Somos chamados a criar algo novo, a
reconhecer também o caráter contextual e diferenciado de todas as verdades e
significados simbólicos que a realidade nos manifesta.
Também é assim nessa
ótica plural que um dos conceitos mais complexos da obra de Nietzsche, A
VONTADE DE POTÊNCIA significa a vida mesma, sem “identidades estáveis”. Em
nossa experiência de mundo nunca nos
defrontamos com algo que possa ser uno e idêntico. O ser é plural e
contraditório. O “eu” é pluralidade de máscaras e impulsos. O indivíduo não tem
um fundamento substancial, mas constitui-se a partir do jogo de diferentes impulsos e forças. Assim, a vida, enquanto
pluralidade de energia e forças se direciona em todos os sentidos: ascendentes,
descendentes, verticalmente e horizontalmente. Me encontro em meio as coisas
perdidas?
Assim com a compreensão
trágica da vida e a vontade de potência, o ETERNO RETORNO é diversidade, é um vir a ser, é devir. O
tempo é para Nietzsche o que está determinado e que simultaneamente está em
aberto, aquilo que foi decidido mas também aquilo que pode ser decidido,
passado e futuro, necessidade e liberdade, duração e eternidade. O tempo é
experimentado sem a segurança de uma estrutura fixa e absolutamente
determinada, sem um “telos”, sem a historicidade linear. O conteúdo ético do
Eterno Retorno repousa num círculo.
A eternidade é agora o
tempo, o tempo é agora a eternidade. A doutrina do Eterno Retorno conduz a “uma
experiência múltipla”, ela é uma hipótese, uma prova, uma experiencia do prazer
de dizer “sim” diante de cada momento, é uma tentativa ética. A realidade
permanece marcada pela diversidade e pluralidade. Todos os princípios opostos e
contraditórios devem aí permanecer e mesmo se pressupõem.
Por fim, o “UBERMENSCH” é
aquele que carrega a diversidade a pluralidade de várias máscara, é como o deus
Dioniso. É o “homem ativo”, o ator que desempenha vários papéis, mas sobretudo,
aquele que sabe desempenhar um papel e
volta sempre mais uma vez a procurar outro papel sem permanecer fixado numa determinada
interpretação. O “Ubermensch” quer afirmar
o mundo nas suas contradições, ele se encontra se perdendo. Ele precisa
afirmar a pluralidade.
SEGUNDA PARTE
Volto à imagem do Filme e
às páginas 30 e 31 do livro em questão da Professora Van Balen. Aqueles pisos
mosaicos dos palácios, das casas, das ruas e dos vitrais de Turim dizem dessa
fragmentação plural e múltipla. Faço pontes com o texto da Professora.
Quem sabe a professora, dance nua e mascarada no quarto de sua casa em Bergen op Zoom? Viva não só no palco do teatro onde trabalha, mas sobretudo no anfiteatro da vida os seus mais variados papéis. O estar inserida e integrada lá, em contato com o outro, ao mesmo tempo que sente-se estrangeira, diferente.
É realmente fantástica a filosofia de Nietzsche e, no caso específico esse estudo sobre a pluralidade como constituinte do “sujeito” e sua “identidade”. Vejo nos escritos de Nietzsche, mais do que pura especulação filosófica, uma espécie de autobiografia, como ele mesmo parece insinuar em sua obra Para Além do Bem e do Mal § 6 : “Aos poucos se evidenciou para mim o que toda grande filosofia foi até o momento: a autoconfissão do seu autor”. Nietzsche é, e não só sua filosofia, essa pluralidade.
Como Dioniso é vida e
morte, dor e prazer, luz e escuridão, essa duplicidade paradoxal e
contraditória ao mesmo tempo relacional, por que Nietzsche exclui dessa
tensão-relação Deus e Homem, sagrado e profano, divino e humano, terra e céu,
imanente e transcendente já que, se por um lado, se excluem, por outro se
pressupõem?
Por fim, faço uma
crítica.
A pluralidade não nega a
unidade. Não seriam a mulher e o homem convidados, em meio as suas contradições
e paradoxos, lágrimas e sorrisos, a viver a unidade na pluralidade e a
pluralidade na unidade? A pessoa toda fragmentada não corre o risco de adoecer
psicosomaticamente? Não estaríamos
correndo o risco de rachar-nos, quebra-nos. Tratar-se-ia, então de aprender a
conviver cotidianamente com a realidade e não de permanecermos na ilusão?
Fragmentos e integridade. Unidade não é evidentemente uniformidade.
Se como Dionisio
aprendermos a juntar e unir os opostos, na vida poderemos juntar vivencial e
existencialmente as duas poesias.
Quando falo com
sinceridade não sei com que sinceridade falo.
Sou variamente outro que
não sei se existe ( se é esses outros ).
Sinto-me múltiplo. Sou um
quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma
única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas.
Sê plural como o
universo.
Fiz de mim o que não
soube
E o que podia fazer de
mim não o fiz.
O dominó que vestia era
errado.
Conheceram-me logo por
quem não era
E não desmenti e
perdi-me.
Quando quis tirar a
máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi no
espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não
sabia vestir o dominó que tinha tirado.
Deitei fora a máscara e
dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela
gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta
história para provar que sou sublime.
PADRE FABIO POTIGUAR SANTOS
Trabalho quando estudante
da Universidade Santa Úrsula
no curso de psicologia
2002.1
para disciplina de Introdução à Filosofia.
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