FREI ALOÍSIO FRAGOSO
(17/03/2021)
Sempre apreciei uma certa alegoria sobre a
temática do amor, que tem como protagonista um jovem apaixonado. Um dia ele
decidiu visitar a sua bem-amada e, para isso, caminhou léguas e léguas floresta
a dentro, até chegar onde ela morava e bater
à porta. - Quem é? Perguntou uma voz vinda de dentro da casa. - Sou eu,
respondeu ele. E a voz replicou - não te conheço. E a porta não se abriu.
Intrigado com esta reação, o rapaz
retornou pelo mesmo caminho e, durante meses, demorou-se a refletir sobre o seu
significado. Por fim, julgou ter desvendado o segredo e aventurou-se em repetir
a jornada. Da mesma voz escutou a pergunta
- quem é? E respondeu de imediato - sou tu, meu amor. E a porta se
abriu, e foram felizes para sempre.
É típica de um coração jovem esta total e
imediata simbiose do eu com o tu, do sujeito com o objeto da paixão. À medida em que se vai
amadurecendo, vão emergindo as diferenças individuais e os parceiros do amor
descobrem que essa utopia de "um só corpo e uma só alma" tem que ser
construída ao longo de toda a vida, sem prazo de validade, através mais das
diferenças e menos das convergências. Coração e razão se aliam para mudar os
arroubos da paixão em consistências do amor.
A despeito de parecer apenas fruto da imaturidade, estes ímpetos
juvenis não são estéreis, não são inúteis, eles tem o poder de fecundar e
acionar o processo de renovação do desenvolvimento humano. É melhor comprovar
esta verdade por meio de acontecimentos reais do que por especulações teóricas.
Um fato incontestável é que tanto os
poderes constituídos quanto os movimentos revolucionários procuram cooptar as
paixões juvenis para seus interesses.
Quem são os escolhidos por grupos extremados para virar "homens
bombas" ("mulheres bombas") em atentados terroristas? - São
jovens na sua grande maioria.
Por outra parte, quem é que manda o maior
contingente de participantes, os mais dinâmicos e criativos, para os encontros
do Forum Internacional, que se sucedem, desde décadas e tem como bandeira de
frente o slogan "Um Outro Mundo É Possivel"? - É a juventude, a
juventude, sempre de novo a juventude.
Daí a indagação dos que viveram, de olhos
abertos, as décadas de 60, 70, 80, neste país: onde anda aquela multidão de
jovens que ocupavam ruas e praças em protesto contra um mundo que teria de ser
um outro, mais humano? - muitos preferiram apagar a memória do seu passado.
Outros viram definhar seus sonhos sob a pressão de cansaço e
desilusões. Sem contar o grande número dos que
foram anestesiados pelas seduções do Mercado e tiveram seus sonhos reduzidos a
objetos de consumo.
Uma parte deles, no entanto, ultrapassou-se
e prossegue na luta, com novo ardor fundado
na Fé, seja de ordem religiosa, seja de outra ordem superior,
transcendental. Por isso não consideram a História humana como um dado simplesmente
lógico, técnico, racional, e sim como um Reino onde irrompem muitas vezes o
inesperado, o imprevisível, surpresas inimagináveis, intervenções divinas.
Estes aprenderam a "esperar contra toda esperança." E acabam
convertendo-se em um marco reinicial de grandes mudanças históricas. O famoso
filósofo dinamarquês Kierkegaard chama esta utopia de "paixão pelo
possível". Os jovens daquela época mudaram esta legenda para outra mais
apaixonante: "seja realista, exija o impossível."
Estes precedentes nos estimulam a
responder: os jovens estão em alguma
parte, em toda parte, à espreita de um novo momento. Precisamos crer nisso, sob
pena de não termos mais no que crer, pois neles está o futuro.
Cabe-nos abrir caminhos
para que eles se aventurem como protagonistas de mudanças radicais;
oferecer-lhes objetivos maiores do que o mero gozo de bens supérfluos, o mero
clarão dos holofotes midiáticos, o mero sucesso profissional, descompromissado
de outras Causas nobres. Ou o mero e medíocre "bom comportamento"
Enquanto isso, deixemos que eles escutem a
voz de um jovem ancião, claudicando de uma perna, mas energizando a juventude
do mundo com palavras candentes:
"Queridos jovens, eu
peço que vocês sejam revolucionários". "Ficarei feliz vendo vocês
correrem mais rápido do que as pessoas lentas e medrosas. Corram atraídos por
aquele Rosto tão amável que adoramos na Eucaristia e reconhecemos na carne do
irmão que sofre. Precisamos de suas intuições, de sua fé e de seus impulsos. E
quando vocês chegarem aonde ainda não chegamos, tenham paciência de esperar por
nós" (Papa Francisco, homilia aos jovens, no Rio de Janeiro e Exortação Apostólica "Cristo Vive")
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