Marcelo Barros
A realidade atual do Brasil e do mundo já nos
proporciona suficientes motivos de tristeza e preocupação. Não precisamos mais
de sinais preocupantes que ainda nos angustiem mais em relação ao futuro.
Qualquer pessoa minimamente informada e isenta sabe que a maioria das pessoas
que negam a gravidade da pandemia e a responsabilidade do governo tentam,
apenas, garantir interesses econômicos ou políticos. Alguns cientistas advertem
sobre a possibilidade de novas pandemias, até mais cruéis.
Em meio a todo esse caos, ouvimos alertas do governo
em relação à crise hídrica e a que a diminuição trágica do volume de águas nas
hidroelétricas do país provocará uma pane elétrica mais grave. A escassez de
água já se manifesta em várias de nossas cidades e tivemos apagões no sistema
elétrico do Amapá e de alguns estados do Norte e Nordeste.
Na quinta-feira, 17 de junho, ecoou no mundo inteiro
um alerta vindo da ONU. Mami Mizutori, representante especial do
secretário-geral na Estratégia
Internacional das Nações Unidas para a Redução de Desastres (UNDRR, na
sigla inglesa) alertou: “é iminente a
ocorrência de uma grande seca que atingirá muitos países do mundo e esta seca pode
tomar a proporção de uma verdadeira e próxima pandemia e para esta, não há
vacinas que nos curem” (Público,
Lisboa, sexta-feira, 18/ 06/ 2021, p. 22).
De acordo com o documento da ONU, este fenômeno será
ocasionado pelas alterações climáticas que provocam diminuição de chuvas.
Também para isso contribui a poluição dos rios provocada pelo elevado uso de
fertilizantes tóxicos, os desmatamentos e uso irresponsável da água para a
indústria do agronegócio.
Nos diversos continentes, os observatórios do clima já
preveem um período longo e indefinido de estiagem que provocará escassez de
água e maior insegurança alimentar. Essa seca afetará o mundo inteiro, se os
países não tomarem medidas urgentes para combater as mudanças climáticas e
cuidarem melhor da água e dos solos. Este relatório da ONU será assunto de
debates e estudos na próxima conferência mundial sobre o clima que ocorrerá em
novembro deste ano, em Glasgow (Cop 26).
Em todos os continentes, ao menos há mais de cinco mil
anos, populações tradicionais têm convivido com secas e períodos de escassez.
No entanto, agora, esse fenômeno de seca e escassez de água é, em grande parte,
provocado por atividades humanas e pelas opções políticas de governos e das
empresas que dominam a economia no mundo.
Conforme o relatório da ONU, esta crise ecológica será
intensa e mais prolongada. Pode durar décadas e vai alterar o clima e as
condições de vida da Terra. Isso vai se refletir mais e mais em áreas de bacias
hidrográficas, mas também em regiões longínquas das mesmas. Na América do Sul,
as fumaças das queimadas na Amazônia são vistas em nuvens tóxicas que descem
sobre o sul do Brasil e sobre o Paraguai, Uruguai e Argentina. A destruição do
bioma do Cerrado em Goiás e Mato Grosso afeta o nível de água dos rios que
desaguam no Plata e na bacia amazônica.
No mundo atual, conforme a ONU, mais de um bilhão de
pessoas não tem acesso garantido à água potável necessária para a vida e a
saúde. Não porque falta água, mas por distribuição injusta e por um sistema
social que faz com que um norte-americano disponha, em média, de 44 litros de
água potável por dia. Enquanto isso, a água disponível em média para um
africano não chega a um litro.
Este comunicado da ONU vem nos dizer que esta pandemia
da seca e da crise da água pode ocasionar uma tragédia para a humanidade mais
grave até do que a Covid. Trará o agravamento da fome e da insegurança
alimentar em vários continentes e ocasionará a volta de enfermidades endêmicas,
que, em outros tempos, a humanidade já tinha parecido vencer.
Para a pandemia do Covid, temos várias vacinas que
funcionam e nos dão boa margem de segurança. Para esta pandemia anunciada pela
ONU, provocada, não por fenômenos naturais, mas pelo sistema capitalista
depredador, a única vacina segura será a conversão ecológica. O papa Francisco
a propõe em sua encíclica sobre o cuidado com a Casa Comum. A conversão
ecológica supõe nos sentirmos todos guardiães das florestas, da mãe Terra e das
águas, assim como das comunidades originárias que, por suas culturas, já vivem
permanentemente este cuidado.
Na cultura antiga do povo bíblico, dois séculos antes
de Cristo, às margens do Mar Morto, surgia um grupo religioso que tentava
renovar a consciência de unidade com Deus, com a Terra e uns com os outros. Em
suas regras, os essênios deixaram escrito o seguinte ensinamento: “Em verdade, te digo: Tu és um com tua Mãe Terra. Ela está em ti e
tu estás nela. Dela tu nasceste, nela tu vives e para ela voltarás novamente.
Olha para o sol, teu avô e louva quem o criou. Segue as leis da terra, pois teu
alento é o alento dela. Teu sangue o sangue dela. Teus ossos são os mesmos
seus. Tua carne, a sua carne. Teus olhos
e ouvidos são também os seus. Quem encontra a paz na sua mãe Terra nunca
morrerá. Conhece esta paz na tua mente.
Deseja esta paz em teu coração. Realiza esta paz com o teu corpo” (Evangelho dos
essênios)[1].
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