O Jornal On Line O PORTA-VOZ surgiu para ser o espaço onde qualquer pessoa possa publicar seu texto, independentemente de ser escritor, jornalista ou poeta profissional. É o espaço dos famosos e dos anônimos. É o espaço de quem tem alguma coisa a dizer.

domingo, 7 de junho de 2020

COVID -19 – TRIGÉSIMA- SÉTIMA REFLEXÃO - O NOME DE DEUS EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS


 por Frei Aloísio Fragoso

     Este domingo celebramos a festa da Santíssima Trindade, o nome que damos ao nosso Deus. Antes de aclamá-Lo com a melodia tradicional do Pai, Filho e Espírito Santo, levantemos algumas questões que poderão transformar nosso canto numa irradiação pura da alma.

     Todas as tentativas de dar nomes definitivos a Deus fracassaram, desde os tempos mais remotos.   A maior parte destes nomes desapareceram da memória coletiva dos povos. Para nós cristãos há uma passagem bem sugestiva no livro do Êxodo. Deus escolhe Moisés para libertar seu povo da opressão do Faraó do Egito. Moisés resiste: "Quem sou eu, Javé? Eu nem sei falar, tenho a língua presa". Deus responde: "Não tenha medo, porei minhas palavras em tua boca". Moisés cede, mas questiona: "E se o povo perguntar quem me enviou?" - "Eu sou o que sou. Tu lhe dirás "AQUELE QUE É ME ENVIOU A VOCÊS". Cf. Ex. 3,1ss.

     "Aquele que é", nesta expressão não há nenhum nome próprio. Deus não tem nome.

     E então, como vamos chamá-LO? Como vamos invocá-LO?  Vamos fazer o que é de costume: criar-lhe um nome. Ouvimos Jesus chamar a Deus de Pai; dizer de si mesmo "Eu e o Pai somos Um"; prometer, certa vez: "O Espírito Santo virá e lhes comunicará toda a Verdade". Daí concluímos: Ele é Pai, Filho e Espírito Santo. Damo-lhe um nome, obra nossa, inspiração divina.

     Estas reflexões se harmonizam com a nossa experiência pessoal. Se perguntarem "quem é você?" Ficarei embaraçado em dar uma resposta correta. A minha pessoa não cabe em um nome que meus pais escolheram para me batizar. (às vezes não tem nada a ver...imagine uma amiga minha chamada Uberlinda, que não é linda nem dirige Uber). No entanto, se alguém quer saber quem sou eu, basta acompanhar meus passos, conhecer minha história, observar minhas ações.

     Não possuimos certezas absolutas nem devemos procurá-las. Nossa Fé é uma aposta. Cremos, confiamos, apostamos. Nem mesmo a certeza de que um dia nascemos nos garante um longo prazo de validade. Pois o que mais almejamos não é existir, é ser feliz.

     Por isso procuramos em Deus a fonte da felicidade. Onde encontrá-LO? - O caminho é o mesmo para todos e diferente para cada um.

     Poucos seres humanos chegaram tão perto de Deus como São Francisco de Assis. De nada adiantaria, contudo, querer copiar o seu itinerário. Pra começar, teríamos que beijar um leproso. Foi assim que ele experimentou pela primeira vez a presença viva de Deus. Após dois anos de inquietação interior, à procura de um sinal, ele encontrou-se com um leproso, casualmente, e, vencendo sua natural repugnância, abraçou-o e beijou-o. Neste momento, ele mesmo confessa, teve certeza de que Deus estava ali, e de qual era a via de chegar mais perto Dele. Vamos imitar S. Francisco? Decerto que não. Mas com ele aprendemos uma coisa: ninguém chega a Deus sem passar pelo irmão, sobretudo o mais desamparado.

     Poucos mergulharam tanto no mistério da Trindade como Santo Agostinho. Ele afirma em sua autobiografia "Confissões": "Tarde Te conheci, ó Beleza tão antiga e sempre nova, tarde Te conheci. Tu estavas em mim e eu, fora de mim, Te procurava". Ao contrário de Santo Agostinho, a maior parte de nós recebeu noções sobre Deus já na infância. Logo, seu testemunho é inútil para nós? Não! Graças a ele, ficamos sabendo uma lição muito importante: o ponto de partida para chegar a Deus está em mim mesmo; tenho de me encontrar e me amar, se quiser aprender a amá-LO.

      Esta semana, conheci um pouco mais sobre Ele nas palavras de uma humilde mulher que perdeu seu filhinho de 5 anos. Ela teve de deixá-lo a sós, no apartamento onde trabalhava, a fim de levar o cachorro da patroa para passear. Ao saber que ele caira do nono andar e estava morto, ela disse: "meu filhinho está com Jesus e com Maria. Ele está no colo de Maria". Neste belo pensamento, há, ao mesmo tempo, uma expressão de conformidade e uma explosão de revolta, um recado de uma mãe ferida e impotente, dirigido a todos nós: meu filho está no colo da Mãe do Céu porque, neste mundo, não havia um colo para ele, enquanto eu tinha que dar meu colo para o cachorro da patroa. Naquele momento Deus era o único poder capaz de livrá-la do desespero. Quem desespera não pode mais lutar. Entender suas palavras como um alívio para nossas consciências, seria uma blasfêmia contra o nome de Deus.

     Nestes dias sombrios de pandemia, onde é possível encontrar Deus? - Certamente Ele está flagelado no corpo dos que foram contaminados pelo vírus e na dor de seus familiares. Ele está crucificado na respiração ofegante de suas vítimas fatais. Ele está amorizado nos profissionais da saúde encarregados de salvar vidas. Ele está ressuscitado nos que alcançaram a cura e agora dançam de alegria.(Haverá algum lugar onde Ele não se encontra? Sim, Ele não se encontra na estupidez dos que negam as evidências para salvar suas ambições, preferem mortes do que perdas de seus lucros. Para estes valem as palavras de Jesus: "são cegos guiando outros cegos; cairão no abismo" MT. 15, 14).

      Sem dúvida, Ele está também em nossas orações suplicantes pelo fim desta tragédia, ouvindo-nos e admoestando-nos: findas as preces, vão ao encontro dos seus irmãos e irmãs e descubram juntos  o único nome meu que há de permanecer para sempre: "DEUS É AMOR" 1Jo.4,8.     Amém!

   Amém. 

FREI ALOÍSIO FRAGOSO é frade franciscano, coordenador da Tenda da Fé e escritor.


Nenhum comentário:

Postar um comentário