FREI ALOÍSIO FRAGOSO
(16/04/2021)
Confesso que titubeei na hora de escolher
um título para encabeçar este artigo. "Mudança de linguagem",
"colapso de linguagem", "corrupção de linguagem",
"nova linguagem"? - O primeiro
pareceu-me óbvio, o segundo, drástico, o terceiro, vulgar e o quarto,
pretensioso. Optei pelo substantivo sem adjetivo, deixando a cargo do leitor
qualificá-lo, ao final.
Trata-se, no entanto, de um fenômeno
merecedor de pesquisas e análises de
filólogos e sociólogos. O que se esconde por trás dessa linguagem chula que sai
da boca e da pena dos que ocupam a mais alta cúpula do poder político, nesta
nossa "pátria amada Brasil"?
Desde que me entendo de gente, nunca ouvira um Presidente da República
chamar palavrões propositadamente, ostensivamente, para os ouvidos de crianças,
adolescentes, jovens e adultos de toda a nação.
E que palavrões! Alguns deles, dos mais fracos, se eu os pronunciasse lá
em casa, tomava uma tapa na boca, seguida de uma ameaça típica de mãe: "da
próxima vez corto sua língua!"
O que diria D. Felicidade ao Mandatário
supremo do país, e aos seus filhos, e aos seus ministros, e ao seu guru, e aos
seus prosélitos, e aos seus acólitos, e ao seu gado?
É preciso ir a fundo na compreensão deste
fenômeno.
Talvez esta linguagem seja uma fotografia
do que se esconde no âmago destas pessoas e elas a reproduzem consciente ou
subconscientemente. Tavez seja um sucedâneo para sua incapacidade intelectual
de interpretar a realidade. Talvez uma linguagem apropriada para quem se nutre
de preconceitos, mentiras, racismo, discriminação. (A sequência de
"talvez" é uma confissão do meu pouco conhecimento deste assunto e um
convite aos leitores e leitoras para buscar respostas).
Ou será uma fórmula de liberar cólera e
ódio como armas de construir qualquer tipo de operação política? Um meio de
transformar o ódio em uma fonte de energias irracionais e, a seguir,
explorá-las na execução de projetos visionários?
Vale lembrar aqui a legenda que levou o
candidato mais improvável da História a ocupar a Casa Branca. "DEIXEM-ME
SER O PORTA-VOZ DA SUA RAIVA", foi o slogan da campanha presidencial de
Donald Trump.
Será que chegamos ao ponto de ter que
ouvir palavrões, vulgaridades, termos chulos, pornofonias, não mais como tabus e sim como um meio de
comunicação tão legítimo quanto a linguagem dos clássicos, e politicamente mais
eficaz?
De certa maneira esta linguagem pode
tornar-se ferramenta para a organização de grupos marginais. A Verdade é
transparente, qualquer pessoa pode crer nela, enquanto crer no absurdo vira uma
demonstração de lealdade grupal, miliciana. Se o meu chefe chama seus
adversários de "filhos da puta", é assim que devo chamá-los também.
Somos uma "nação,". Temos um idioma. Este é o nosso idioma. Desta
forma, este modo de comunicar-se se agrega a uma visão própria do mundo,
diferenciada
das elites tradicionais
politicamente corretas (e, de alguma forma, fracassadas).
Contudo, o que a mim causa maior
perplexidade é a sensação de que estamos assistindo a uma batalha aberta entre
a inteligência e a irracionalidade.
Estes indivíduos não possuem idéias elaboradas, não conseguem desenvolver um
pensamento com sujeito, verbo e predicado, não suportam qualquer contestação
que os obrigue a raciocinar, não admitem
nenhum tipo de intermediação, situam-se todos no mesmo plano, possuem um único
parâmetro de avaliação, visam uma adesão cega e imediata e, se confrontados com
argumentos que escancaram sua ignorância, calam o adversário com palavras de
ordem: comunistas! Petistas! Deus acima de tudo!
Em suma, parece que estamos diante de um
novo exército constituído de peças humanas robotizadas, comandadas por um
cérebro supra-nacional, com um projeto global de dominação. Acontece que
este enredo nós já vimos muitas vezes em
filmes de ficção científica.
Não tenho dúvida de compará-lo a uma
estátua descrita na Bíblia, em Daniel, 2,30-34: "cabeça de ouro, peito e
braços de prata, ventre de bronze, pernas de ferro, e pés de barro".
Infalivelmente desabará. Para a glória de Deus e o bem do seu Povo. Amém.
Frei Aloísio Fragoso é frade franciscano, coordenador da
Tenda da Fé e escritor
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