FREI ALOÍSIO FRAGOSO
(22/04/2021)
Nestes últimos tempos, tenho encontrado
alguns companheiros de luta com surtos de impaciência, a indagar: por que é que
este povo não vê o que é real, mas, ao contrário, só enxerga o que aparenta
ser? Que droga de cegueira é esta! Eu lhes diria ainda: maior é o número dos
que percebem a realidade tal qual, porém não possuem a coragem de
contradizê-la, preferem abrigar-se sob o guarda-chuva da opinião pública, da
maioria silenciosa.
E me pergunto também por que? Por que a
Verdade amedronta mais do que as aparências? Somados prognósticos, notícias e
pesadelos, confesso que também a minha paciência está sendo posta à prova para
além das minhas forças.
Aí escuto, sussurrando aos meus ouvidos,
a voz de um anjo: "Paciência! Lembre
o que disse o Mestre: "quem escolhe andar no escuro odeia a
luz, pois tem medo que suas obras sejam
reconhecidas" Jo.3,20. Muitos há que tem olhos e não querem ver, tem
ouvidos e não querem ouvir, tem cabeça e não sabem pensar. A última coisa que
toleram é confrontar-se com argumentos irrefutáveis." Tudo bem, meu
anjo-mensageiro, contudo não há agressão
maior contra a paciência do que a imbecilidade.
Grandes pensadores oferecem suas
explicações, algumas delas terrivelmente maquiavélicas. A exemplo do próprio Maquiavel.
Ele aconselha os governantes a permanecerem atentos às ondas da opinião pública
e, de acordo com os ventos soprando pró ou contra, terem um espírito versátil,
fazendo o bem enquanto possível e recorrendo ao mal, se necessário. E a
praticarem a arte da perfeita simulação, pois as pessoas são tão simplórias e
se deixam de tal maneira dominar pela necessidade do momento que, aquele que
queira enganar, encontrará sempre quem aceite ser enganado.
A outros que circulam em torno do poder
como abelhas em volta da colmeia, ele sugere não se afastar muito para não
perder as benesses do poder, nem se aproximar demais, para não ser arrastado na
queda, em caso de fracasso (qualquer coincidência com o "Centrão" não
é mera casualidade).
Maquiavel à parte, nós cristãos buscamos,
na seara da Fé, energias espirituais para perseverar nesta incessante luta.
Dois anos de Governo incompetente, um ano de pandemia devastadora, uma
avalanche diária de notícias fúnebres, medos e dúvidas... "oh, Deus, dai-nos
paciência!"
Este assunto é um ponto de atrito entre
nós e Deus. Entre sua infinita paciência e nossas humanas indignações. Para Ele
"um dia é como mil anos e mil anos, como um dia" 2 Pe. 3,8. Para nós,
no entanto, "a vida é breve, o tempo urge", escreve S. Paulo. Jesus
esclarece as razões de Deus na parábola das duas sementes: "Senhor, queres
que arranquemos a semente malfazeja, para que brote somente a boa? - Não!
Deixai que cresçam juntas, no dia da colheita eu mesmo farei a separação."
Mt.12,24ss.
Por conseguinte, Deus não discrimina nem marca prazo. Só
empenha sua Palavra. Da nossa parte, é crer e agir, o contrário seria dar murro
em ponta de faca ou desesperar.
Daí a sensatez de conectar a nossa
paciência compulsória com a paciência histórica, aquela que repassa as grandes
crises passadas e recentes, e reaprende suas lições.
A pandemia atual nos humilha no sentido em
que nos mostra quanta coisa ignoramos e quanto é frágil o nosso poder. E nos
ensina que a única estratégia capaz de superar o que aparenta ser invencível é
unir nossas capacidades. Outras calamidades do passado provaram esta verdade:
embora tenhamos que tropeçar em gente psicopata e malfeitora, embora milhões de
indivíduos desistam pelo caminho, nós olhamos a humanidade coletivamente, e o
que vemos? Ela é o melhor exemplo de paciência e perseverança: jamais abandona
a realização do seu destino.
É nesta nossa história de contradições
que Deus escreve a sua História da Salvação.
(Paciência, voltaremos ao assunto).
Frei Aloísio Fragoso é frade franciscano, coordenador da
Tenda da Fé e escritor
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