Marcelo Barros
Neste domingo,
as Igrejas antigas iniciaram um novo ano litúrgico com o tempo do Advento.
Tradicionalmente, o objetivo destas quatro semanas que nos preparam à festa de
Natal é fortalecer a esperança na realização do projeto divino e celebrar o
Natal de cada ano como sinal de renovação em nossas vidas e na forma de organizar
o mundo.
Há uma semana, aconteceu
em Assis, na Itália, o encontro do papa Francisco com mais de 2000 jovens
economistas do mundo inteiro. O objetivo era pensar juntos novo modelo econômico
que una sustentabilidade ecoplanetária, justiça social e viabilidade para as
ciências e novas técnicas que se abrem para o futuro. O papa propôs uma
economia que parta das necessidades dos empobrecidos do mundo e garanta a todos
e todas as necessidades básicas como terra, trabalho e teto.
A primeira
vitória deste encontro foi ter provado a falsidade do dogma neoliberal. Sempre
se repetia que não há alternativas e o mundo tem de ser assim mesmo. O encontro
da juventude em Assis sobre economia mostrou o contrário: há diversas
alternativas. Outra grande vitória é que provavelmente é a primeira vez no
mundo em que um encontro internacional deste porte não se concentra em ouvir os
cientistas mais renomados. Os protagonistas do encontro foram rapazes e moças
com menos de 35 anos de idade. O encontro foi exemplo de diálogo
intergeracional.
No Brasil, por
mais de um ano, este encontro da juventude com o papa sobre Economia foi
preparado e discutido. Concretamente, deste processo de preparação, surgiram algumas
propostas. Eis algumas:
1) retomar o
esforço de um grande mutirão de educação popular, baseado na participação de
todos, no diálogo e na consciência dos desafios a serem enfrentados por toda a
sociedade.
2) compreender
que a economia de tal forma é essencial a todos os seres humanos que não pode
ser deixada apenas à responsabilidade dos técnicos e especialistas.
3) desenvolver
e aprofundar os projetos de economia solidária.
4) assegurar
uma renda básica universal, como direito
de todos os cidadãos e cidadãs de cada país.
5) ajudar todas
as pessoas a perceberem que esta nova forma de organizar a economia é expressão
de uma espiritualidade ecumênica e
humana. Isso vai além das religiões e possibilita a integração maior do ser
humano com todos os seres vivos do planeta.
Para
compreendermos melhor: A renda básica é totalmente viável desde que se crie um
fundo específico que pode ser alimentado com recursos oriundos de impostos
progressivos e da taxação de grandes lucros e fortunas.
Não se trata de
uma solução mágica e total, mas pode eliminar a pobreza extrema. Liberta as
pessoas de trabalhos aviltantes e ajuda a que os salários não sejam sempre puxados
para baixo.
Sobre a
economia solidária: Trata-se de um
conjunto de iniciativas que abrange cooperativas, empresas recuperadas, ou em reabilitação de processos falimentares.
Nela cabem pequenos empreendimentos associativos, bancos comunitários e
associações locais de troca de mercadorias e serviços. Muitas destas
iniciativas desenvolvem moeda própria. Este tipo de economia, baseada na
autogestão, é fundamental no processo de verdadeira democratização da
sociedade.
O orçamento participativo foi experiência nas
primeiras gestões do PT no Brasil. Reúne as populações de bairro em plenárias
para discutir e deliberar sobre a destinação de recursos orçamentários.
Trata-se de um exercício de democracia participativa. Exige vontade política
dos gestores e certa organização popular para se exercer o diálogo social e
político.
Considerar a
economia como dimensão importante da espiritualidade é levar em conta que não
se pode dividir a vida em departamentos separados. A economia não se restringe
aos bens duráveis e de consumo, além de serviços. Há fatores espirituais,
próprios da condição humana que devem ser levados em conta e aprofundados. A
economia deve ajudar as pessoas a serem solidárias e a construir um mundo
baseado no cuidado mútuo e na comunhão com a natureza.
Assim, a
economia de Francisco e Clara se torna elemento fundamental de uma abertura da
sociedade internacional e de cada povo à realização mesmo sempre em processo e
parcial de um programa que as diversas tradições espirituais creem ser divino: possibilitar
o natal de uma humanidade nova.
Marcelo Barros, monge beneditino e escritor, autor de 57 livros dos quais o mais recente é "Teologias da Libertação para os nossos dias", Ed. Vozes, 2019. Email: irmarcelobarros@uol.com.br
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