Tempos sombrios amantavam os
olhos de quem se sentia atravessado por uma misteriosa fragrância de libertação.
Falo de mim: jovem, seminarista, sonhador e desejoso de encontrar um caminho
alternativo às lúgubres veredas do fundamentalismo eclesial e teológico.
A minha procura levou-me ao
CEBI – Centro de Estudos Bíblicos –, cuja porta de entrada foi um curso de
formação de assessores em leitura popular da Bíblia. Ali, encontrei-me com
gente que, como eu, buscava a libertação, quiçá uma possibilidade de
sobrevivência no “deserto eclesial”, presságio do golpe político de 2016 e da
elevação do fascismo pelas urnas.
Minh’alma sedenta via-se à
iminência de esfacelar-se ante tão longa e malograda procura por águas. Foi
então que, naquele encontro promovido pelo CEBI, conheci Dom Sebastião Armando
Gameleira Soares. Seus cabelos grisalhos, olhar profundo, porte esguio, voz
mansa-firme e mãos borboleteantes formavam uma espécie de abóbada poética sob a
qual a nudez espiritual, longe de ser um despudor, figurava como exigência
fundamental do Evangelho.
Dom Sebastião refletia conosco
sobre o livro do profeta Amós. A cada segundo, tornava-se mais claro para mim
que as palavras daquele livro eram tão suas como de Amós, pois habitavam seu
corpo, musicavam sua voz, conduziam o seu olhar, ritmavam seus passos, batiam
no seu coração.
Ao fim daquele encontro, conversamos
reservadamente. Contei-lhe de minhas buscas, de meus itinerários espirituais,
da voz que me chamava desde dentro para ir além. De sua parte, ouvi poucas
palavras, mas suficientemente fortes para levá-las comigo ad aeternum.
Uma delas, intuição que me tem guiado desde então: “A Bíblia é uma escola de
liberdade”.
Desde então, aproximamo-nos
cada vez mais. Hoje, alguns anos após nosso primeiro encontro, sinto-o como pai
no sentido pleno da palavra. Minha liberdade carrega o sinal de sua mística, o
calor de seu abraço, a profundidade de seu olhar, a ousadia de seu espírito.
Hoje, por ocasião de seu
septuagésimo quinto aniversário, canto e danço de alegria pela vida de Dom
Sebastião, Flor no meu deserto.
Kinno Cerqueira é pastor batista, biblista e
assessor do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) na área de estudos bíblicos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário