por Kinno
Cerqueira [1]
Hoje
é Sexta-feira Santa, dia em que as igrejas fazem memória da Paixão de Jesus,
quer dizer, de seu “sofrimento” cujo ponto alto é a crucifixão. Num dia como
hoje, ganham relevo dois gestos religiosos: gratidão a Deus por Jesus haver
morrido em nosso lugar e petição pelo perdão de nossos pecados. A meu ver, tais
gestos revelam uma imagem/concepção de Deus que habita a mentalidade cristã.
O
primeiro gesto é alimentado por uma liturgia na qual quase tudo gira em torno
do assassinato de Jesus, comumente explicado como sendo o resultado de Deus
haver enviado seu filho Jesus Cristo para morrer em nosso lugar, levando sobre
si o martírio que se abateria sobre nós em virtude dos nossos pecados. O segundo
gesto, intimamente vinculado ao primeiro, deita suas raízes na compreensão de
que o assassinato de Jesus lhe outorgou o status de aliviador de
consciências e garantidor de vida eterna para quem nele deposita a sua fé.
Ambos
os gestos, porém, encaminham-nos para uma questão mais profunda, que é aquela
que nos interroga pela imagem de Deus que subjaz a tudo isso. Em linhas gerais,
podemos ver aí a imagem de um Deus sádico e perverso, cujos caprichos chegam ao
ponto de exigir um assassinato bárbaro como condição para refazer as pazes com
a humanidade. Tal imagem de Deus não poderia gerar outro cristianismo que não
fosse o do tipo sacrificial, sádico e perverso, cujos reflexos lesam e alienam
todas as dimensões da vida humana.
A
vida de Jesus, quando lida atentamente, revela-nos uma perspectiva
diametralmente oposta à assinalada acima. Jesus, no mundo, assumiu a missão de
ensinar-nos a viver. Com suas opções de vida e suas palavras, anunciou não um
outro mundo, mas um mundo outro, quer dizer, fez de sua vida um testemunho
incontestável de que é possível vivermos irmanados num projeto de “amor
cósmico” que ele chamou de Reino de Deus.
Como
o projeto de Jesus traria como consequência a dissolução de todos os poderes
opressores, quer religiosos quer políticos, chefes da religião de seu país
uniram-se ao império para pôr um fim à sua vida. Jesus sabia que sua maneira de
viver determinaria seu modo de morrer. A cruz era o destino comum de
sonhadores! Sua morte não se explica a partir de Deus, mas a partir de sua
opção pessoal de assumir o amor como princípio vida até as últimas
consequências.
A
vida de Jesus revela uma genuína imagem de Deus: o Deus crucificado com os
crucificados, indignado com as injustiças e partidário inarredável do amor.
Esse Deus não está nos altares, mas nos corpos abandonados e hostilizados, nas
vozes fracas e cansadas de tanto sofrer, como também nos corações de todas as
pessoas que, assim como Jesus, fazem de suas vidas testemunho do amor que
abraça o cosmos. O Deus revelado na vida de Jesus pede de nós somente um
sacrifício: fazer morrer o egoísmo para que o amor nasça como uma flor em tempo
primaveril.
[1] Kinno Cerqueira é
pastor batista, biblista e assessor do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) na
área de estudos bíblicos.
Obrigada, pastor Kinno. Sempre preciso e sensível com as palavras.🙏🏽👏🏽
ResponderExcluirObrigado amigo e irmão ! Estamos em comunhão desde Brasília onde estamos com Maria nossa filha que está esperando gêmeas. A Páscoa abençoada para você . Abraço grande!
ResponderExcluir