Por Marcelo Barros
Embora não pareça, há
profunda relação entre a celebração judaica e cristã da Páscoa e o dia da Mãe
Terra que a ONU nos propõe celebrar no 22 de abril de cada ano. Cristo
ressuscitado se manifesta a nós na terra que resiste e tenta superar o sistema
que a agride e ameaça.
A maioria dos cientistas estão de acordo: a pandemia do
Covid 19 foi mais rápida e cruel porque encontrou ambiente favorável na
atmosfera poluída, nas águas profanadas pela mineração e na terra devastada
pelo Capitalismo. Por isso, além de nos proteger como humanidade contra esse
vírus mortal, é preciso deter a crise ecológica que fere o planeta. Para isso, a
ONU nos convida a, mesmo em quarentena, comemorar o 22 de abril como “dia internacional da Mãe Terra”. O
objetivo é nos fazer sentir como humanidade, filhos e filhas da Terra e, assim,
renovar o nosso amor e nosso cuidado com nossa casa comum.
Há duas décadas, o Painel
Intergovernamental da Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês),
introduziu a ideia de “ponto de virada”,
ou o ponto do não retorno. É o momento no qual não há mais como retomar ao
que era antes. Os estudos mostraram que mudanças em alguns ecossistemas
influenciam em transformações que passam a ocorrer em outros, como efeito, ou
como uma peça de dominó derruba a outra. Quando se atinge determinado ponto,
não há mais como restaurar a vida.
Atualmente, geleiras da Antártica se derretem. Em dez anos,
o Oceano Atlântico teve aumento de um grau na sua temperatura. A Amazônia é
transformada em pastagem. Quase dois terços das grandes florestas do mundo
estão destruídas ou em ameaça de destruição. Calcula-se que, cada ano, 50 mil espécies
desaparecem da Terra. A cada dia, lançam-se no ar, na terra e na água produtos químicos que, mesmo anos depois de
lançados, continuam a causar morte. Aumenta a emissão de dióxido de carbono e
outros gases que causam o efeito estufa na atmosfera. O buraco de ozônio que
protege a atmosfera terrestre aumentou e ameaça a vida de populações inteiras e
de muitas espécies animais. Assim, o aumento entre 1 e 2ºC será suficiente para
atingir o pronto do não retorno.
Nestes meses de quarentena forçada da humanidade, um
fenômeno surpreendeu a todos: em vários lugares do mundo, extremamente
agredidos pela sociedade dominante, rapidamente, a natureza se revelou com
energias de recuperação. Na lagoa de Veneza, bastou 15 dias sem barcos de
petróleo a sujar as águas e já se viam peixes e pássaros marinhos nas margens e
pontes da cidade. O mesmo fenômeno tem ocorrido em diversos lugares do mundo.
Muitas pessoas se perguntam quantos dias ainda faltam para
voltarmos à normalidade. Essa normalidade seria o comércio aberto, as ruas
cheias de veículos, os aviões atravessando todo o planeta. E os governos que
cortam verbas para a saúde e educação gastam, como, no ano passado, um trilhão
e 822 bilhões em armas, portanto, cinco milhões por dia... As previsões para
esse ano é de soma maior. Querem forçar as pessoas a trabalharem, correndo riscos,
apenas para saciar a ambição da pequena elite da humanidade que desfruta dos
benefícios desse sistema. Com vírus ou sem vírus, em todo o mundo, aumenta a
desigualdade social. A maioria da
humanidade simplesmente ignora isso e o planeta sofre as consequências.
É urgente estabelecer novo modo do ser humano se inserir na
comunidade de todos os seres vivos que habitam o planeta. É preciso mudar a
economia de modo a torná-la compatível com a dignidade humana e com a
sustentabilidade ecológica. O problema não é tecnológico. É sobretudo cultural,
social e político. Por isso, temos de nos dar conta da gravidade da situação e
nos comprometermos em viver um modo novo de nos relacionar com a Terra, a água
e o conjunto da natureza.
Nesse caminho, as religiões e tradições espirituais têm uma
responsabilidade imensa. Todas as tradições espirituais redescobrem a relação
com a Terra, a água e os elementos do universo como caminhos de intimidade com o
Mistério Divino. Para salvar a vida na Terra, precisamos retomar um estilo de
vida mais sóbrio e comunitário. Nessa celebração pascal, celebramos o Cristo
Cósmico que ressuscita e assume o corpo do planeta Terra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário