Por Marcelo Barros
As Igrejas celebram a Páscoa como ensaio de uma vida
nova que todo mundo precisa. Muitos estão repetindo que a atual crise que a humanidade
atravessa, por mais dolorosa que seja, pode gerar algo novo. É preciso começar um
novo modo de conviver conosco mesmos, com o mundo e com a fonte da Vida que as
religiões chamam de Deus
.
Para se
proteger do vírus mortal que devasta o mundo e para ajudar os outros, médicos e
enfermeiros têm métodos e ritos. Também a condução política da sociedade tem
ritos. Esses vieram das práticas cultuais dos povos antigos. O rito é como ensaio
ou treinamento. Através de símbolos, expressa o que as pessoas querem realizar
no mundo. Quando em cerimônias públicas, cantamos o hino nacional ou saudamos a
nossa bandeira, estamos, de fato, expressando o desejo de um país unido e
livre. Do mesmo modo, nesses dias, Igrejas cristãs celebram a Páscoa para
propor uma transformação da vida e do modo de organizar o mundo.
A Páscoa é
uma festa comum a duas religiões: o Judaísmo e o Cristianismo. Antigamente, a
Páscoa era a dança com a qual as tribos indicavam que começou a primavera. Assim,
a natureza se revestia de uma vida nova. De acordo com a Bíblia, foi durante os
festejos de uma dessas festas de Páscoa, que, inspirados e conduzidos por Deus,
escravos hebreus se libertaram do faraó do Egito. Cada ano, até hoje, as
comunidades judaicas celebram essa festa para atualizar sua vocação para a
liberdade. Dão graças a Deus que fez aliança com o povo oprimido para que toda
pessoa seja livre e com direito a viver sua dignidade humana. Os escritos
cristãos testemunham que foi, durante uma celebração anual da Páscoa judaica, que
Jesus de Nazaré foi assassinado e foi em meio à celebração da Páscoa que os
seus discípulos o descobriram vivo e vitorioso. Cada celebração pascal, tanto a
vivida pelas comunidades judaicas, como que as Igrejas cristãs celebram, festeja
a vitória da vida sobre a morte e da solidariedade sobre o desamor e isso não
apenas para as Igrejas mas para todo o mundo.
Neste ano, a
celebração judaica da Páscoa ocorreu na 5ª feira, 09 de abril, mesmo dia no
qual as Igrejas lembravam a última ceia de Jesus e a instituição da eucaristia.
Nesses dias, judeus e cristãos celebram essa festa em meio à quarentena provocada pelo
coronavírus. Por causa disso, as Igrejas foram obrigadas a retomar o costume do
Cristianismo primitivo das reuniões nas casas e das celebrações em pequenos
grupos, de forma mais laical e sem depender totalmente de ministros ordenados.
Essa Páscoa
deve dar à humanidade um recado especial: nosso Deus é Deus da vida e não da
morte. É amigo da humanidade e como pai que nos ama com amor maternal é o
primeiro a sofrer com o que nós sofremos. Nesses dias, ele deve estar se
sentindo muito magoado com muitas orações que supõem que ele é culpado de
alguma coisa de tudo isso que está acontecendo. E, coitado, na sua impotência,
como diante da cruz do próprio filho, mesmo em meio às alegrias da Páscoa, ele
chora. Como Jesus chorou diante do túmulo do amigo Lázaro. E faz o que pode
fazer por nós: fazer florescer em nossos corações as sementes de amor e
solidariedade para enfrentar o momento atual e vencermos.
A
celebração pascal contêm uma força capaz de transformar o mundo, até que cada
pessoa que ama e tem fome de justiça e
todo o universo sejam impregnados da energia amorosa dessa nova Páscoa. Um
antigo hino oriental canta: “Se Jesus
ressuscitou, seja como for, o mundo está salvo, aleluia”.
MARCELO
BARROS é monge beneditino e escritor. Tem 57 livros publicados. O mais recente
é Teologias da Libertação para os nossos dias (Vozes). Email:
contato@marcelobarros.com
Obrigada padre Marcelo. A palavra é sempre um alimento para nós. Abraço
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